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A ESCRAVIDÃO NA BÍBLIA.

Este texto e parte integrante  de um artigo maior postado neste blog: A TEOLOGIA PRESENTE NOS DISCURSOS DA IGREJA CATÓLICA       NO FIN...

08/12/2019

A INFLUENCIA DA TRADIÇÃO E DA CULTURA NA RELIGIÃO BÍBLICA.



A TRADIÇÃO E A CULTURA: Uma visão critica.


A influência das tradições históricas na cultura brasileira

As Tradições fazem parte da cultura de um povo ou de uma sociedade.  Diversidade cultural implica em diversidade de tradições. Por exemplo, no Brasil devido o predomínio religião católica, a qual reina soberana no Brasil por mais de 500 anos, temos diversas datas comemorativas ligados ao catolicismo. São feriados exclusivamente católicos, o qual comemoram dias santos  não tendo nada a ver com o calendário oficial do estado ou com outras religiões. Algumas datas comemorativas já fizeram parte do calendário de feriados oficial do país, instituída e protegida lei, como é o caso do dia 12 de outubro (LEI No 6.802, DE 30 DE JUNHO DE 1980). Exte exemplo serve para exemplificar como, no Brasil,  o catolicismo vinha determinando o estilo de vida de todos os brasileiros, inclusive daqueles que não professa a fé católica. A intensão foi, de alguma forma,  utilizar o governo para institucionalizar a religião católica e mostrar sua força sobre as demais religiões em crescimento naquela década. A CF-1988 juntamente com a abertura politica associado ao crescimento do protestantismo no Brasil pós fim a este comportamento do governo militar; no entanto o feriado católico continua exercendo força sobre toda população e na economia do país,  ainda que seja ponto facultativo nas instituições públicas. Os feriados catolicos são “guardado” pelos católicos praticantes e esperado pelo restante da população, inclusive os evangélicos,o qual aproveitam da data para alguma atividade extra em suas igrejas. Aliás, que não quer um dia de descanso no meio da semana ou um final de semana prolongado. Isso é cultura brasileira, E, portanto, uma tradição no país aceita por todos.   






As festas municipais também são ditadas pela religião católica. Somente recentemente, divido ao crescimento do protestantismo no Brasil, começaram a instituir datas religiosas protestantes, como o dia da Bíblia. A Lei Federal 10.335 instituiu o segundo domingo de dezembro para a celebração do Dia da Bíblia em todo o território nacional. Foi um conquista da bancada evangélica no Congresso. Esta data não foi escolhida por acaso, mas devido a uma tradição europeia do século XVI quando se dava ênfase especial a Palavra de Deus no segundo domingo devido a aproximação do Natal.
No entanto, os católicos reservara o dia 30 de setembro como o dia da Bíblia em Hhonra  a São Jerônimo, o qual traduziu o manuscrito do grego para o latim no  inicio do séc. V DC. Esta tradução ficou conhecida como Vulgata (comum) , a qual se tornou a Bíblia oficial da igreja Católica, pondo fim aos muitos textos em latim já existente. Note que a tradição, especialmente a de origem religiosa,  dita as normas e a moral  por séculos dentro em determinado grupo, povo ou raça..
O uso do estuário: Roupa branca no Ano Novo,  uso de bombacha no RS e o Chapéu de couro no Nordeste. Nos vocabulário, o uso das jíriias: ‘Põ, Meu’ (paulista); ‘...Más Bá, tchê’(gaúcho); ‘...Visse’, oitio (oito), no nordeste e “vamos comer um trem” ou “oh trem bom sô”, em Minas Gerais; as músicas e as danças regionais, todos estes comportamentos caracterizam um povo.  Cada etnia (povo, nação) possui suas tradições, determinadas pela sua cultura, a qual  resiste ao tempo.

A influência das Torá  na cultura judaica


Não poderia ser diferente no mundo bíblico, antes e depois de Cristo.  No Israel Antigo (AT) havia as três grandes festas religiosas instituída pela Lei de Moises, a saber: a festa da Páscoa, a festa das Barracas (tabernáculos) e a festa do Pentecostes.  O apostolo Paulo, mesmo depois de sua conversão, retornava a Jerusalém para adorar a Deus nestes dias festivos (Atos 20.19). Na última viagem para Jerusalém Paulo foi acusado de  levar os judeus da diáspora (i.e. que viviam entre os gregos) a deixarem de seguir os costumes da Lei (Atos 21.21).  Paulo foi meio que obrigado pelo grande bispo de Jerusalém Tiago, irmão de Jesus, a fazer um voto de retratação para resgatar a confiança dos judeus convertidos a Cristo mas que ainda eram judaizantes, isto é (i.e) guardavam certos costumes da Lei.
         Os judeus conservavam, por séculos, tradições herdadas de seus antepassados considerando serem preceitos ordenados por Deus. E outras tradições foram agregadas ao longo de sua historia originárias das relações com povos vizinhos e das interpretações  que fizeram das seus livros sagrados. Por exemplo, a religião dualista dos Persas, o zoroastrismo, que concebia a ideia do bem e o mal sempre em oposição e inexistência de sacrifício de sangue. Não aceitaram dela a ideia de não haver sacrifício de sangue, mas receberam forte influencia do dualismo.   
         O Talmund (estudo), semelhante a uma enciclopédia, é muito reverenciada até os dias de hoje e autorizados por muitos judeus de hoje. Abrange leis religiosas e civis e está dividida em: 1) Mishna- lei oral e 2) a Guemara, comentário.
Segundo explicações judaicas encontradas, a Torá oral (Torá she-be’alpê) foi entregue no Sinai por Deus ao Profeta Moisés, são leis orais que não foram registradas na Torá escrita (Torá she-bichtav) ou seja, o Pentateuco, mas foi passada por tradição oral e permaneceu entre a comunidade hebraica até após a destruição do segundo Templo em 70 d.C.  Para que essas tradições e ensinamentos não se perdessem  houve a necessidade de registrá-la, vem tarde no século II, para explicar  tais tradições.
        

A imfluência do Talmud na cultura judaica

O Talmude começou a ser compilada por Rabi Jehuda (Yehudá ha-Nassi), por volta de 188 d. C. , produzindo a Mishna (ou Mixena) – Lei Oral, originalmente escrita em hebraico.
A Mishna Compõe-se de uma série de declarações, organizadas por assunto e tópico, que ensinam as leis, a tradição e a história judaica. Os estudiosos judeus explicam que a Mishna compreende a lei, a explicação direta e concisa da lei oral transmitida por Deus a Moisés no Deserto e que foi passado por tradição oral.  
A Gemara é um  comentário e elucidação da Mishna escrita em um jargão hebraico-aramaico. Escrita ao longo do tempo tornando-se “um conglomerado de milhares de anos de sabedoria, história, legislação, lendas e filosofia judaica’. No entanto, é considerada tão divinamente inspirada que nada difere da Torá escrita.

“Ademais (o Talmud), mistura, - entre outras áreas do conhecimento - as ciências à lógica, aconselhamento prático, lições e relatos extraordinários, palavras de perspicácia e inspiração e, até mesmo, ocasionais toques de humor”.

Talmudé uma mescla de arte e ciências: é o livro da legislação judaica - técnico e preciso - mas é também uma enciclopédia e uma obra magistral de sabedoria, jamais igualada na história da humanidade.

Quanto às declarações atribuídas aos mestres (sábios) ou à escola de pensamento que as elucidou e difundiu. Afirma que estes sábios talmúdicos foram mais do que simples ‘cadeia de transmissão’ que remonta ao Profeta Moisés. Pois destes mestres, está escrito que atingiram tão elevado nível espiritual que conseguia até ressuscitar os mortos. Em si, esses mestres, personificaram a Vontade de Deus; portanto, cada aspecto de sua conduta e cada uma de suas palavras foram marcadas por absoluta precisão e orientação Divina.

 “Talmud define e dá forma ao judaísmo, alicerçando todas as leis e rituais judaicos. Enquanto o Chumash(o Pentateuco, ou os cinco livros de Moisés) apenas alude aos Mandamentos, o Talmud os explica, discute e esclarece. Não fosse este, não entenderíamos e muito menos cumpriríamos a maioria das leis e tradições da Torá e o judaísmo não existiria”.  Para o judeus o Talmud é o único livro que interpreta corretamente a Torá’[i].

Feitas estas incisões constatamos que as tradições judaicas tem origem nas explicações extraídas da Torá pelos mestres (rabinos) judeus.  As praticas judaicas tradicionais antigas e atualmente advem de sucessivas interpretações e reinterpretações da Torá escrita e Torá Oral. Esta ultima presente no Talmud.
Segundo narrativas judaicas a origem do Talmud  acontece em 188 a. C.  com a compilação da Mischa pelo Rabi (do Talmud) Yehudá ha-Nassi e no séc IV d. C. um ‘importante sábio babilônico’, Rav Ashi, iniciou a compilação de todo o Talmud e seus discípulos e os alunos deram continuidade em redigi-lo esta grande obra.

Rav Ashi, importante sábio babilônico, iniciou a compilação de todo o Talmud. Seus discípulos e os alunos destes deram continuidade à gigantesca obra de redigi-lo. No entanto, diferentemente da Mishná, o Talmud foi oficialmente completado por nenhum erudito em particular; daí dizer-se que “ainda está por ser terminado”. Através dos séculos, suas palavras e ensinamentos foram meticulosamente analisados, interpretados e explicados por incontáveis sábios, estudiosos e mestres. É geralmente comparado ao oceano sua vastidão é tremenda, mas sua profundidade é incomensuravelmente maior. De fato, é um fiel testamento da Infinita Torá de D’us.
  

Há outras coletâneas de diretrizes e ensinamentos, que são parte integrante da Torá Oral: Sifra e Sifri,Tosefta e Bareitot, além dos Midrashim, que também foram preservados por escrito, muitos dos quais dentro da própria Guemará. No entanto, a Mishná tem precedência sobre os demais ensinamentos da ToráOral. Isto significa que sempre que houver uma aparente contradição entre um ditado da Mishná e qualquer outro ensinamento da Lei Oral, caberá àGuemará buscar a verdade na qual se fundamenta o tema, com base na própria Mishná.


Considerações finais
É notável e surpreendente como os escritos de um religião conservam e perpetua a tradição de um povo.  E quando dentro de um mesma região ou país existem duas grande religiões, como é o caso do Brasil e Israel,  estas religiões estão sempre em disputa pra conseguir lugar de destaque. Em Israel, judeus e árabes disputam espaço territorial e religioso. A Mesquita de Omar, também conhecida com “Dona da Rocha” é um importante templo religioso dos muçulmanos ocupando o espaço onde já foi o principal lugar de adoração dos judeus.  No Brasil, católicos e neo pentecostais  disputam seguidores utilizando meios sincréticos, muitas vezes anti-bíblicsos. O suntuoso Templo de Salomão na Avenida Celso Garcia faz frente a Basílica de Aparecida; tudo isso, é claro, feito em nome de Deus e para Deus; sem considerar que “Deus não habita em templos construído por mãos humanas”.
Por outro lado, a tradição tem seus benefícios, mas esse assunto ficara para outra ocasião.




[i]  http://www.morasha.com.br/leis-costumes-e-tradicoes/o-que-e-o-talmud.html

TEOLOGIA PRESENTE NOS DISCURSOS DA IGREJA CATÓLICA NO FINAL DO SÉC. XIX COM RELAÇÃO A ESCRAVIDÃO.


FACULDADE PASCHOAL DANTAS
 Bacharel em Teologia


    



José Maria Vieira Rodrigues



São Paulo
 2017
JOSÉ MARIA VIEIRA RODRIGUES



A TEOLOGIA PRESENTE NOS DISCURSOS DA IGREJA CATÓLICA   NO FINAL DO SÉC. XIX COM RELAÇÃO A ESCRAVIDÃO. 


.
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Bacharel em Teologia à Faculdade Paschoal Dantas (FPD), orientado pelo Prof.º Me. Heres Drian de Oliveira Freitas e Prof. Me. Wasley Rodrigues Gonçalves como requisito para a obtenção do titulo de bacharel em Teologia.



São Paulo
 2017

  R         
              

Rodrigues, José Maria Vieira

A teologia presente nos dircursos da igreja católica no final do séc. XIX com relação a escravidão / Jose Maria Vieira Rodrigues- São Paulo: 2017.
 83f
 Inclui Bibliografia

 Monografia (Bacharel em Teologia)
 Faculdade Paschoal Dantas  
 Orientadores: Prof.º Me.Heres Drian de Oliveira Freitas e
 Prof. Me. Wasley Rodrigues Gonçalves

1. Teologia  2. Abolição 3.Catolicismo I.Título                                  
                                                                     
                                                CDD.200
                                                                  
 

























A TEOLOGIA PRESENTE NOS DISCURSOS  DA IGREJA CATÓLICA   NO FINAL DO SÉC. XIX COM RELAÇÃO A ESCRAVIDÃO.  


Por JOSÉ MARIA VIEIRA RODRIGUES

Trabalho de Conclusão de Curso de Bacharelado em teologia a Faculdade Paschoal Dantas (FPD), como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel, sob a avaliação da seguinte banca examinadora:




______________________________________________
Orientador Profº Me. Heres Drian de Oliveira Freitas


_______________________________________________
Co-orientador Profº Me. Wasley Rodrigues Gonçalves


_______________________________________________
Ex: Convidado Profº Me. Públio Carlos de Azevedo




Aprovado em _____de ______________de________________.




DEDICATÓRIA


Dedico este trabalho a minha falecida mãe Natália, a primeira pessoa que ganhei para Cristo e quando viva dedicou sua vida aos filhos e sempre esteve presente na minha vida e preocupada com meu sucesso.
À minha esposa Rosangela Vieira Rodrigues pelos incentivos e dedicação.
Aos meus filhos Matheus, Raphael, João Gabriel e Katharinna Giovanna.
E principalmente.  ao Senhor Jesus Cristo que me restituiu saúde para terminar este curso. A Ele toda honra e a glória para sempre. 


AGRADECIMENTOS


 À coordenação pedagógica da Faculdade Paschoal Dantas na pessoa Me. Sra. Marcia Simões pelo apoio e orações.
Ao Diretor Geral Sr. José Deuzimar Dantas pela amizade e confiança. 
À minha nora Brenda que colaborou no abstract deste trabalho.
 Aos meus mestres e amigos instrutores  que no decorrer do curso foram exemplos de dedicação e fé, a saber:

Me. Leandro Silva Selari,
Me. Heres D. D. O. Freitas
Me. Wasley Rodrigues Gonçalves,
Me. Shirlônio Rodrigues Pereira,
Me. Públio Carlos de Azevedo
Me. Darli Alves de Souza,
Me. Ivan Pereira Guedes
Me. Daniel Lucas Noronha de Sena,
Me. Denis Alves de Souza, Me. José Alves Ribeiro Neto
Dr.  Edemir Antunes Filho, 
Pe. Henrique Prestes,
Me. João Batista Ribeiro dos Santos,
Me. José Lopes.

A estes sábios homens de Deus minhas honras e mais elevada estima.






RESUMO 

O presente texto discorre sobre a teologia presente nos discursos da Igreja Católica Romana com relação à escravidão no final do século XIX. Foi utilizada como base teórica as teorias da Formação do Discurso e da Analise de Discurso das escolas francesa e Russa representadas pelos filósofos franceses Michel Foucault e Pêcheux e pelo filósofo Russo Michel Bakhtin ao afirmarem que a historicidade e o interdiscurso atuam na formação do discurso. Será apresentado o discurso com relação à escravidão vista no Brasil Império pela sociedade e política; e o pensar teológico da Igreja Católica sobre a escravidão. Descreve-se a escravidão presente na Bíblia comparada com a teologia dos discursos escritos: cartas pastorais, jornais e encíclicas papais; bem como a atuação da Igreja no processo de emancipação e suas justificativas de ausência no movimento abolicionista. 

Palavras-chave: discurso, teologia, escravidão, abolição, catolicismo.


  



ABSTRACT. 


The present text exposes about the theology present in the Roman Catholic Church's discourses regarding slavery in the late nineteenth century. The theoretical basis for it was the theories of Discourse Formation and Discourse Analysis from the French and Russian schools, represented by the French philosophers Michel Foucault and Pêcheux, and by the Russian philosopher Michel Bakhtin, in stating that the historicity and the interdiscourse operate on the Formation of the Discourse. The discourse will be presented with regard to slavery seen in Brazil Empire by society and politics; and the theological thinking of the Catholic Church on slavery. Will be described the slavery present in Bible compared to the theology of written discourses: pastoral letters, newspapers and papal encyclicals; as well as the role of the Church in the process of emancipation and its justifications for absence in the abolitionist movement.

Key-words: discourse, theology, slavery, abolition, Catholicism



ABREVIAÇÕES



SPNSM –                  Sociedade Patrocínio Nossa Senhora das Mercês.
IS. LVI. I –                  Livro de Isaías capítulo cinquenta e sei (56), verso um (01), 
Luc. IV.19-                 Evangelho de Lucas, capítulo quatro (4), verso dezenove (19).
Ef. 1:10 -                    Epístola aos Efésios capítulo um (1), verso dez (10).
Gn. 1:25 -                  Livro de Gênesis capítulo um (1), verso vinte e cinco (25).
Gn. 9:25-NVI -           Livro de Gênesis capítulo nove (9), verso vinte e cinco (25) na                                   versão da Bíblia – Nova Versão Internacional.
NVI -                           Bíblia Nova Versão Internacional.



                                                              SUMÁRIO
          INTRODUÇÃO
1.  Tema.................................................................................................................................13
2.  Conceito do termo Discurso..........................................................................................13
3.  Espaço temporal e geográfico.......................................................................................14
4.  Objetivos..........................................................................................................................14
5.  Base teórica para o termo ‘discurso’............................................................................14
6.  Teologia: definições e conceitos...................................................................................15
7.  Delimitação do objeto.....................................................................................................16
8.  Importância e relevância................................................................................................16
9.  Hipóteses.........................................................................................................................17
    
            CAPITULO UM
1.      O DISCURSO DO ESTADO E DA SOCIEDADE EM FASE A ESCRAVIDÃO NO BRASIL IMPÉRIO..........................................................................................................21
1.1. A Formação do discurso e historicidade...................................................................21
1.2. O Brasil Império: situação social e politica...............................................................22
1.3.  Inicio da emancipação da escravidão no Brasil......................................................25
1.4. A escravidão no Segundo Império (1840-1889): mudança de consciência............26
1.5. A situação do negro e classificação social no início do séc. XIX...........................28

            CAPÍTULO DOIS
2.         A IGREJA E ABOLIÇAO..............................................................................................31
2.1.   A Igreja e abolição e sua relação com o negro.......................................................31
2.2.    A Igreja no processo de emancipação e nos movimentos abolicionistas............35
2.3.    Diamantina: emancipação mineira e o desenvolvimento local..............................36
2.4.    Os jornais no processo de emancipação.................................................................37
2.5.    As cartas pastorais.....................................................................................................39
           
            CAPÍTULO TRÊS
3.         A TEOLOGIA E A ESCRAVIDÃO
3.1.  Catolicismo brasileiro: religião oficial e formação da teologia.............................40
3.2.    A evangelização católica e a doutrina escravista em
perspectiva histórica..................................................................................................44
3.3.    Expansão territorial e evangelização do negro........................................................45
3.4.    Raízes da formação doutrinária.................................................................................47
3.5.    A escravidão na Bíblia................................................................................................50
3.6.   O desvio de propósito da Igreja................................................................................55
3.7.  Acontecimentos dos últimos dias.............................................................................58
           
            CAPÍTULO QUATRO
4.       O DISCURSO E TEOLOGIA........................................................................................60
4.1. Conceito de Analise do discurso em Foucault, Bakhtin e Pêcheux......................60 
4.2. A teologia no discurso da carta de D. Lacerda bispo do RJ....................................62
4.3.  Teologia no discurso de D. João Antônio Santos....................................................63
4.4.  Teologia no sermão do padre Sypolis no artigo do jornal Jequitinhonha.............64
4.5. Teologia na Encíclica papal de Leão XIII de 05 de maio de 1888.............................65

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS.....................................................................................69
5.1.  A acomodação............................................................................................................69
5.2. Posição indiferente e conservadora..........................................................................70
5.3. Desinteresse pelas questões sociais........................................................................72
5.4. Defesa de interesse.....................................................................................................73
5.5. A hipótese falta de discurso a favor da emancipação 
e do atraso da abolição....................................................................................................74  
5.6 A hipótese da falta de uma missão bem definida.....................................................75

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS........................................................................................77
7.WEBSITTES VISITADOS………………………........………………………..80
8.      8.REFERENCIAS.....................................................................................................81


INTRODUÇÃO

1.    Tema.
Este texto tem como principal objetivo dissertar sobre a teologia nos discursos do clero da Igreja Católica em relação ao processo de abolição dos escravos do Brasil no final do século XIX. A teologia encontrada na qual se fundamentou os religiosos dominante neste período quando se posicionarem contrários ou favoráveis à abolição dos escravos. 
 Pesavam muitas acusações sobre a Igreja Católica de terem assumido posição indiferente e conservadora em relação à escravidão, se submetendo aos interesses do Governo e dos “senhores” de escravos como afirmavam o abolicionista Luiz Anselmo Fonseca (V1929) (Azzi, 1988, p.55 e Fonseca, 1887, p.12). 
2.    Conceito do termo Discurso.
            Discurso é algo que vai além dos textos e enunciados, os quais neles se baseiam. É todo o conjunto de formas de comunicação, uma linguagem ou formas discursivas à qual pertençam. Sendo que o mais importante não é o conteúdo do discurso, mas o que ele comunica, pois, um discurso dominante tem o poder de determinar o que é aceito ou não em uma sociedade (AZEVEDO, pp.155-157). Consideramos também o sentido sociológico quando afirma que discurso “é um modo de agir, uma forma pela qual as pessoas agem em relação ao mundo e principalmente em relação a outras pessoas” (TILIO, p. 100).[i]   
 Estão, em pauta, os discursos orais e textuais e a estes se incluem o sentido filosófico, o teológico e o social do pensamento da Igreja Católica com relação à escravidão africana para justificar a abolição da escravidão, informar como aconteceram as atitudes discursivas da Igreja a favor da libertação do elemento servil e sua participação. As comparações destes ideários Católicos com a dos movimentos abolicionistas são inevitáveis e necessárias para traçar uma linha divisória no sentido discursivo, embora os objetivos fossem os mesmos, a saber, a emancipação ou o conteúdo era diferente.  Nos discursos clericais geralmente, tinham justificativas teológicas, enquanto que nos discursos abolicionistas eram discursos etno-social e político-econômica.

3.    Espaço temporal e geográfico.
            Os discursos analisados são do fim do séc. XIX proferidos pelo clero católico, todavia, foi necessário fazer uma recapitulação da história, principalmente porque para a Análise do Discurso (AD) leva em conta a historicidade da sociedade analisada. 
            Os fundamentos teológicos se expressaram nos discursos escritos: as encíclicas, as cartas pessoais e pastorais e as publicações em jornais no período a partir da década de 70 quando se agravou as tensões entre Estado e Igreja que levou à Questão Religiosa. 
Os movimentos abolicionistas, inclusive aqueles com a participação da Igreja, são citados, mas não são objetos de estudo. Também os discursos abolicionistas, mas não serão objetos de análise e estudo.  A concentração se deterá nos discursos eclesiásticos e seu comportamento.

4.    Objetivos
            A finalidade principal é a teologia presente  discursos eclesiástico contidos nas cartas pastorais, nas encíclicas papais e nos relatos de jornais que relata algum discurso clerical dessa época. Por isso, ´com a finalidade de justificar a origem do discurso e seu conteúdo, foi necessário descrever a historicidade da escravidão no Brasil e a condição escravista entendida pela sociedade e o escravo diante de seus opressores declarados.  Esta situação social servil está inserida em um contexto histórico-social, isto é, a história do Brasil Império.
            O objetivo específico é observar o fundamento teológico que nortearam o pensamento do clero e por consequência a formação do discurso do episcopado da Igreja. Encontrar alguma manifestação da ciência de Deus no sistema discursivo da Igreja com relação à escravidão que a justifique ou a condenasse. Saber: qual o fundamento que justificasse sua ausência no apoio aos movimentos abolicionistas e posteriormente, nos últimos anos que antecederam maio de 1888, o que fez com que a Igreja mudasse de opinião favorável à libertação e finalmente festejar a abolição?

5.    Base teórica para o termo ‘discurso’.
            Considerou-se além dos (1) conceitos modernos da Formação do Discurso encontrado no filósofo russo Michel Bakhtin (1895-1975) e no filósofo Francês Michel Foucault (1926-1984).  Onde são levados em conta os acontecimentos, os fatores históricos e sociais como elementos importantes na ‘Formação do Discurso do Sujeito’. Assim descreve Sara Dionízia R. de Azevedo (2013) que para Foucault “os elementos históricos são fundamentais para compreender a formação discursiva” e inclusive os discursos na sociedade contemporânea. Michel Foucault “oferece um saber como construção histórica, e como tal, produz verdade que se instalam e se revelam nas praticas discursivas” e estas verdades “são questões históricas, são produções sistemáticas que manifestam também por meio de discursos científicos tidos por verdades, positivos e, por isso, aceitos e tomados em toda sua positividade”. No entanto, após pesquisas na área do ‘discurso’, verifiquei que deveria considerar não apenas as teorias da Formação do Discurso encontradas em Bakhtin e Foucault, mas (2) considerar a teoria da Analise do Discurso encontrado no trabalho de francês Michel Pêcheux (1938 – 1983) onde na ótica da Análise do Discurso o sujeito é atravessado tanto pela ideologia quanto pelo inconsciente. “Onde o sujeito tem a ilusão de ser a fonte, a origem de seu discurso”.  O sujeito é social interpretado pela sua ideologia que conscientemente pensa ser de posse exclusiva e original, mas é um sujeito separado de sua fonte original da fonte discursiva. Isto é, este sujeito tem a ilusão de ser o centro do discurso, mas é um sujeito separado da liberdade discursiva. Para a Análise do Discurso, “o dizer do sujeito é sempre determinado por outros dizeres, ou o discurso é sempre determinado por interdiscursos”. Logo, pode se conceber que “a memória discursiva são esses sentidos já cristalizado e legitimados na sociedade que são reavivados no interdiscurso” (GUERRA, p.04). 

6.    Teologia: definições e conceitos.
            Para o termo “teologia”, considerou-se significado etimológico dos católicos João Batista Libânio e Afonso Murab (1996), que afirmam ser a “ciência sobre Deus”, “o estudo de Deus” onde Deus é o objeto e o centro do estudo. Para estes teólogos a teologia não é “uma sequência de movimentos que termina em Deus, mas trata antes de tudo, de operação intelectual humana; que se configura determinado tipo de saber, de conhecimento. Num esforço de compreensão que a inteligência humana empreende”.  Serão vistos a teologia como atividade humana com relação à escravidão, cuja investigação recai na aplicabilidade de conceitos teológicos que a Igreja Católica compreendia naquele momento histórico.
            Por Igreja Católica, fica subentendido que se trata de todo o conteúdo eclesiástico da instituição composto pelo corpo clerical e suas substancias mentais e intelectuais, todo o ‘comput’ do saber e existentes teológico e filosófico agregando-se as tradições, dogmas e historiografia.

7.    Delimitação do objeto.
            O presente estudo monográfico analisa qual foi a teologia no discurso da Igreja Católica em relação ao sistema escrava e no processo de abolição dos escravos do Brasil no final do século XIX.  Observando o “discurso” sob a perspectiva teórica dos conceitos de Michel Foucault e Michel Bakhtin quando afirmam que a ‘formação do discurso’ está relacionada com os acontecimentos históricos. E ainda que o discurso formado tenha a interferência de interdiscurso e que nem sempre são originais de seus interlocutores conforme a teoria vista em Michel Pêcheux.

8.    Importância e relevância.
            Este período da história guarda um vasto número de acontecimentos que ainda não vieram a lume e são desconhecidos para a sociedade. Desta forma, é extremamente importante e relevante mexer nos arquivos relativos a este período. Estes documentos históricos guardam informações importantes para a teologia e para o mundo acadêmico. 
            No período que se propõe este estudo, a Igreja Católica se manteve ausente das questões sociais, atuando apenas de forma bem discreta. O comportamento foi sendo corrigido no decorrer do séc. XX, principalmente a partir de Concílio do Vaticano II (1961-1962).
            A Igreja Católica é amplamente usada como objeto de estudos, por ser o catolicismo uma das maiores religiões, pela sua influência na sociedade como formadora de opinião e cuja missão incluem o bem-estar dos oprimidos. Saber como a Igreja se comportou diante do clamor abolicionista, se sua percepção ao clamor foi favorável ou silenciosa; se este silêncio era uma não percepção ou se era proposital, intencional em defesa de interesses próprios, são questões que se pretende responder neste estudo.
             Historicamente o Brasil foi o último país ocidental a abolir a escravidão; desta forma, saber se houve uma voz profética que contribuiu substancialmente para que houvesse mudança social, uma vez que a igreja é importante para a sociedade e mediante tão grandiosa problemática que era a abolição, torna a pesquisa muito relevante.
            Entender a participação da igreja no processo da abolição e se houve algum fundamento teológico para que ocorresse a mudança de comportamento nos últimos anos que antecederam a abolição, nos leva a formular opiniões a respeito e tirar conclusões de comportamento religioso diante de mudanças sociais. Se a teologia não esteve presente no pensamento católico; a filosofia ou o social; saber o que poderia justificar a mudança ocorrida de um discurso que favorecia a escravidão para outro que a condenava.
Aborda-se, portanto nesta dissertação, a teologia contida no discurso da Igreja Católica; se nos seus discursos e escritas do final do século XIX, havia algum conteúdo de teor teológico principalmente. Ficou em segundo plano a discussão filosófica e social que defendesse o direito de liberdade dos escravos destituídos de totais direitos de cidadania como afirmava Dr. Malheiro (1866) jurista da época.

9.    Hipóteses.
            É bem possível que os interesses que mantinham a Igreja Católica no poder pode ter sido uma possível causa que fez calar sua voz profética e, portanto, interferiram nas ações da Igreja e, por conseguinte na sua mensagem discursiva prejudicando as vitimas da escravidão.
            O estudo revelou que a década de 80 foi marcada por fervorosos movimentos abolicionistas e da pacata atuação da Igreja; este assunto é debatido por Camila Mendonça Pereira (2011) em sua dissertação de Mestrado no programa de pós-graduação pela Universidade Federal Fluminense (UFF) em 2011 onde ela pergunta: “como o clero contemporâneo agiria diante do acontecimento de maio 1888? Como foi marcada a participação da igreja Católica? E qual a participação da elite do clero? Por que o Papa interveio e qual sua influencia no processo de abolição?”.  Respondidas estas perguntas poderemos chegar às respostas que expressaram os sentimentos da Igreja e sua teologia com relação à escravidão e assim solucionar as hipóteses do porque houve pequena participação da Igreja no processo abolicionista e ausência de discurso em favor da emancipação que expressem o conteúdo teológico.  
            As hipóteses são:
1)    O desinteresse da igreja e seus motivos e causas;
2)    A missão não definida diante do compromisso da Igreja como responsável pela divulgação do Evangelho;
3)    A ação voluntaria das Ordens religiosas no processo de emancipação; As Ordens Católicas eram acusadas, inclusive pelo jornal “O Abolicionista”, de darem péssimo exemplo ao serem ‘senhores de escravos’; isto é, havia um envolvimento direto da Igreja com a escravidão, logo o seu discurso favorável aos escravos ficou comprometido.
4)    A atuação na última hora: De algum modo as Ordens católicas mudaram de opinião e muitas Ordens foram dispensando seus escravos, mesmo a contragosto de alguns, isto é, havia um envolvimento direto da Igreja com a escravidão. Então até que ponto a Igreja acabou prestando um serviço considerável a si mesma e à abolição no sentido do exemplo ou no sentido do discurso?
            Nesta época, a Igreja buscava renovação e autonomia influenciada pelas aspirações transmontanas e pelas aspirações progressistas tanto no setor político como no eclesiástico, portanto, saber qual foi a real missão da Igreja em meio ao clamor social e aquilo que sacrificou em meio aos seus objetivos principais; então é bem possível que a teologia tenha sido deixada de lado e a preocupação fosse outra, menos a mensagem religiosa. 
            Esta abordagem temática aconteceu através de um desafio de pesquisa literária, em teses, dissertações, monografias, artigos científicos e livros da época e atuais.  Passados mais de cem anos da abolição e por ser o tema ‘escravidão’ considerado por Riolando Azzi (1989, p.55) “difícil de ser estudada”, dada à escassez de fontes e por ter ocorrido antes de uma época de transição política, quando muitas fontes históricas, ou foram destruídas com o objetivo de se esquecer do passado horroroso de 300 anos de escravidão vivido desde o Período Colonial, ou se perderam no tempo permanecendo poucos registros literários e documentais. Assim como aconteceu na época da ditadura (1964-1985), muitos arquivos do final do sec. XIX foram destruídos para apagar registros históricos comprometedores e vergonhosos para a sociedade religiosa da época.  
              O método de pesquisa empregado foi bibliográfico, em fontes secundarias que conforme Marconi e Lakatos (2003, p.183) “são aquelas que já se tornaram públicas com relação ao tema de estudo que estão em boletins, jornais, revistas, livros, monografias, teses, material cartográficos, etc.”.  Como afirma este autor, não se tratará de uma mera repetição do que foi dito, mas uma construção do tema sobre outro enfoque ou abordagem e chegar à conclusão inovadora.
            No  primeiro capítulo desta obra, faz-se um estudo da formação do discurso através da  historicidade do Estado e a sociedade envolvendo a escravidão. Pois, conforme afirmam os teóricos franceses, a história de determinada instituição é formadora do discurso. Neste capitulo é informado a situação politica, econômica, social e religiosa do país envolvendo a escravidão.
            No segundo capítulo são vistos a ações da Igreja e sua relação com o elemento servil no que tange a abolição, a emancipação de escravos em poder das ordens religiosas, sua participação no movimento abolicionista e ações praticas para libertação dos negros. E, no final da década de 80, suas manifestações discursivas vistas em cartas pastorais e na bula papal de Leão XIII.  
            No capítulo terceiro destacamos a teologia que se formou ao redor da escravidão a partir do séc. XV, que deu sustentação ao caráter colonizador lusitano e justificavam as ações empreendias em território brasileiro e que perdurou em todo período oitocentista. Como se dava a evangelização dos negros em comparação com os indígenas e a justificativa bíblica para a escravidão num relato da história da escravidão na Igreja primitiva. 
Foi necessário recapitular de forma resumida a história da Igreja e sua relação com a instituição da escravidão com a finalidade de constatar se havia algo; um elo entre a história da Igreja Católica e sua relação com o sistema servil que pudesse justificar o pensamento discursivo. No capítulo quatro fiz uso dos discursos da Igreja com relação à escravidão e assim, fazer uma breve aplicação prática da teoria da Formação do Discurso (FD) e Análise de Discurso (AD) dos teóricos franceses e russos. O que se pretende é mostrar que os discursos que existiram tinham uma fonte e origem histórica e serviram de base para os discursos dos padres, bispos e papas.
            Nas considerações finais apresento o parecer sobre o assunto expressando opiniões; respondendo às questões levantadas acima sobrea as possíveis hipóteses de o clero ficar em silêncio e sua apatia no movimento abolicionista. 
            Não foi objetivo nesse estudo criticar o catolicismo romano, por isso apresentei textos que fazem parte de um vasto arsenal literário disponível para verificação, mas apenas estudar como se formou o discurso da Igreja e a teologia nele contido. Tudo que é dito neste estudo, já foi escrito em algum lugar. Seja num papel (não sei!), seja no consciente das pessoas. 

CAPITULO UM

   O DISCURSO DO ESTADO E DA SOCIEDADE EM FASE A ESCRAVIDÃO NO BRASIL IMPÉRIO.

            1.1. A Formação do discurso e historicidade.

            A escravidão foi um fenômeno social na historia da humanidade que passou por todas as épocas, desde Idade antiga ate início da Idade Contemporânea, sobrevivendo até o final do século XIX no Brasil. Para compreender o atraso da abolição no Brasil, relatamos de forma resumida a situação política, econômica e social, desde seus primórdios, com vista à escravidão e sua relação com a religião católica. A recapitulação da historia também se faz necessária, na medida em que nela encontramos os fundamentos da formação do pensamento que compôs o discurso escravista seguido pelos portugueses e adotado pela Igreja que vigorou por todo período colonial e imperial.
Este levantamento e observação são vitais quando se tem por base de comparação os conceitos de Formação de Discurso do filósofo francês, Foucault e do russo, Bakhtin, onde basicamente afirmam que “os elementos históricos são fundamentais para compreender a formação discursiva e dos discursos na sociedade contemporânea” (AZEVEDO, 2013). De Pêcheux sobre Analise do Discurso, quando considera o interdiscurso como elemento formador do discurso onde “o dizer do sujeito é sempre determinado por outros dizeres, ou o discurso é sempre determinado por interdiscursos”. Logo, pode se conceber que “a memoria discursiva são esses sentidos já cristalizado e legitimados na sociedade que são reavivados no interdiscurso” (GUERRA, p.04); O discurso português, mais especificamente do clero, tem suas origens em raízes históricas; portanto, o objetivo dessa abordagem é encontrar a gênese da formação do discurso que advém do pensamento e sentimentos existentes nos lusitanos em consonância com a Igreja, em especial no catolicismo, com relação à escravidão negra.
            Segundo Emília Viotti da Costa, as mudanças ideológicas’ ocorridas na Europa por ocasião da Revolução Francesa (1789-1799) e Revolução Industrial (a partir de 1760), acabaram por criar conceitos novos no pensamento da sociedade europeia. A burguesia se opôs a derrubar o antigo regime questionando “o poder divino atribuído ao rei e proclamar a soberania dos povos, exigindo a criação de formas representativas de governo” (VIOTTI DA COSTA, p.17) foram fatores determinantes que deram inicio a extinção da escravidão em todo o mundo.
            O Brasil foi um dos últimos países a deixar de se utilizar da mão de obra escrava em sua economia. A justificativa reside em vários fatores que vão desde o combate às ideias revolucionárias francesas[ii], ignorância cultural da sociedade luso-brasileira, revoluções e revoltas internas, drasticamente combatidas, e interesses econômicos dos grandes latifundiários e participação efetiva da Igreja. No entanto, seriam destas ideias revolucionárias, segundo Emília Viotti da Costa (p.17), “nos pensamentos dos revolucionários do século XVIII que se encontram as origens teóricas do abolicionismo”. Entretanto, a cultura colonizadora teve grande relevância para justificar esse atraso. Podemos destacar a afirmação de Sergio Buarque de Holanda [iii] em ‘Raízes do Brasil’, justificando a influência cultural dos países europeus no resto do mundo, inclusive sobre Portugal. Em resumo, Holanda afirma que Portugal e Espanha eram monarquias menos europeizadas que os demais países europeus e não tiveram uma hierarquia feudal tão enraizada, tendo como consequência disso, uma frouxidão organizacional trazida ao Brasil, além de uma burguesia precoce em relação aos demais, que não gostava de trabalhar pesado, físico e regular e das atividades profissionais utilitárias, mas sim de serem senhores (HOLANDA, p. 31-39). “Podemos dizer que de lá veio a forma atual de nossa cultura; o resto foi matéria que se sujeitou mal ou bem a essa forma”, completa Holanda (Idem, p.40).
             A Grã-Bretanha, metrópole econômica de Portugal, exerceu papel fundamental para a total abolição da escravidão no mundo e especialmente no que diz respeito ao Brasil, pois tinha grande interesse em manter certo colonialismo econômico em vez de territorial e politico. Para os ingleses “era mais interessante manter a calma no Brasil e ir reformando o país à moda dos ingleses, suavizando sua tolerância beata e ensinando-lhes a eficiência nos negócios” (RAUCK, p.21). 
           

            1.2. O Brasil Império: situação social e politica.

             A vinda da corte portuguesa no inicio do século XIX trouxe grande progresso econômico cultural e político, muito embora a opressão continuasse agora mais de perto. A vinda da corte portuguesa trouxe mudanças significativas na sociedade do Rio de Janeiro.  Grande contingente de emigrantes europeus (15 mil vieram com João VI) desembarcaram no Novo Mundo, trazendo suas profissões, culturas e filosofia. Paralelo à exigência da Inglaterra de abertura dos portos alfandegários e a elevação da Colônia à condição de Reino Unido (16 de dezembro de 1815) em condições de igualdade com Portugal, “provocou sentimentos irmanados de independência e unidade” (HAUCK, p.22).    
Este sentimento fez explodir por todo pais revoluções de independência e ideias republicanas motivadas pela aproximação com a Europa e os ideais franceses especialmente entre os clérigos, militares e representantes de liderança das províncias.  
            O modelo político social adotado no Brasil por D. Pedro I foi o de continuidade do modelo político existente na península ibérica de monarquia absolutista e feudal de interesses de classes dominantes. O pensamento liberal que norteava a mentalidade dos revolucionários europeus não atravessou as barreias imposta pelos governantes brasileiros para alcançar a mentalidade burguesa luso-brasileira, aliás, a própria elite latifundiária se tornou obstáculo.  
Hauck nos informa qual foi o sentimento da população pobre no Brasil independente:

Lei alguma consagrava a desigualdade, todos os abusos eram o resultado do interesse e dos caprichos dos poderosos e dos funcionários. Mas são esses homens que no Brasil foram os cabeças da evolução, não cuidavam senão em diminuir o poder do rei, aumentado o próprio. Não pensavam, de modo algum, nas classes inferiores. Assim o pobre lastima o rei e os capitães-generais, porque não sabe mais a quem implorar apoio (HAUCK, p.27) [iv].
 

            De 1817 a 1824 foram anos de unificação nacional e consolidação da independência proclamada por D. Pedro I em 1822 que teve como figura central na revolução de independência, José Bonifácio. Um dos poucos liberais que realmente pensava no povo: defendia a reforma agrária com distribuição dos latifúndios e a abolição gradativa da escravidão. De personalidade forte criava inimizades em um grupo de pessoas de interesses pelo poder. Sua queda em 1823 ocorreu devido ao seu programa social combatido pelos portugueses, comerciantes, soldados e pelos grandes proprietários.

Contra a verdadeira independência do Brasil combatiam poderosíssimos interesses. È interessante notar como todos os lideres políticos se voltaram contra José Bonifácio por causa de seu programa social.  O liberalismo brasileiro era insensível à justiça social; não trazia a democracia, pois o liberalismo só valia para certos grupos (HAUCK, 2008, p.26).
  
            José Bonifácio de Andrade e Silva considerava a escravidão “uma instituição nefasta”, corruptora da oral e dos costumes, e inibidora do progresso do País’, entretanto, José Bonifácio, assim como outras vozes favoráveis a abolição nesta época, como Maciel da Costa e Hipólito da Costa, não era considerado um representante da elite dominante brasileira permanecendo mais em Portugal do que no Brasil (Ibidem, p.20).
Verificamos que os programas sociais e as ideias revolucionárias favoráveis de interesse da classe servil começaram desde cedo a sofrer resistência por parte das lideranças politicas e econômicas dominante que se formaram durante o período colonial: os ricos ou os latifundiários.
            O período de 1830 a 1850 foram marcados por revoltas e revoluções civis de classes e de raças motivadas por interesses diversos conforme seus interesses. Interesses republicanos e separatistas, agrários e latifúndios e por interesses abolicionistas. Foi grande a participação do povo, da parte de alguns religiosos, da imprensa e até dos indígenas. Segundo Hauck (p.29), “não apareceu uma liderança de valor que aglutinasse e representasse os anseios do povo nestes anos difíceis, e seus movimentos e protestos são reprimidos com perigosa agitação social”. Para Hauck, essas revoltas eram uma acomodação das camadas sociais e raciais, com predomínios dos grandes senhores agrícolas. Serão essas classes vitoriosas que vão orientar a economia e liderar os interesses do país.
            A economia do Brasil, depois de trezentos anos de colonização portuguesa, passados quase todos os Ciclos (do Pau Brasil, da Cana de açúcar e do ouro), o Brasil era uma nação pobre. Por todos os lados o que se via eram sinais de decadência. “Faltou ao Brasil uma fonte de riqueza que pudesse acelerar o ritmo de passagem de agricultura extrativa para a exploração industrial” (RAUCK, p.34). Mesmo os produtos agrícolas estavam agora sujeitos a concorrência internacional.   
            O povo profundamente religioso estava em completa submissão às autoridades em respeito e temor que chegava a bajulação e ao medo para uma resignada tolerância dos constantes e graves abusos de poder (HAUCK, p. 35, 36).
            Os trabalhadores eram uma classe inexistente, como entendemos hoje. Os escravos eram os encarregados de todos os serviços manuais, seja nas fazendas ou na cidade. Pois ainda se pensava que o trabalho manual desonrava a pessoa livre. Até mesmo o mulato se esquivava do trabalho braçal. Os portugueses que na sua terra eram trabalhadores e criados no Brasil preferiam passar fome que se submeter a trabalho braçal.  Os camponeses inexistiam devido à escravidão e a dificuldade de acesso às pequenas propriedades. A urbanização gerou uma classe social desqualificada para o trabalho onde somente os portugueses e estrangeiros mesmo analfabetos tinham oportunidades de crescimento (HAUCK, p. 39-40).

            1.3. Inicio da emancipação da escravidão no Brasil.

            A abolição dos escravos no Brasil é marcada por dois estágios: o de construção e o de desconstrução. O de construção que começa antes da colonização brasileira com o crescimento de Portugal nas navegações e percorre todo o processo de colonização de 1500 a 1808 com vinda de família real ao Brasil. O estagio de desconstrução começa com o acordo comercial Brasil-Inglaterra, com a proibição do tráfico de escravos até a abolição final em 1888.  Aproximadamente 370 anos de escravidão em terras brasileiras; um número incontável de negros vieram para o Brasil nesse período sem contar os indígenas.
            A mudança de pensamento com relação à escravidão tem ligações diretas com as revoluções ocorridas na Europa: na Inglaterra com a Revolução Industrial e na França com a Revolução ideológica com os Direitos Humanos e no modelo político, como já foi ressaltado anteriormente. A erradicação do trafico teve inicio na Inglaterra com aprovações de leis através de esforços de políticos abolicionistas e reformadores protestantes como Willian Wilberforce (1759-1833) [v].
            Segundo Viotti da Costa (p.18) foi através dessas mudanças ideológicas que o que era vista como a vontade e designo de Deus agora era visto como criação e vontade do homem, portanto “transitória e revogável”. No passado a escravidão era considerada um corretivo para os vícios e ignorância dos negros e via-se na escravidão a sua causa. “Passa-se a criticar a escravidão em nome da moral da religião e racionalidade econômica. Descobriu-se que o cristianismo era incompatível com a escravidão”. O trabalho escravo começa a ser visto como menos produtivo que o livre e a escravidão como uma instituição corrupta da moral e dos costumes (Ibidem, p.18).
            A industrialização e a ideologia francesa custaram chegar ao Brasil pelas barreiras impostas pelo governo e pela elite dominante que temiam prejuízos econômicos, pois o Brasil era um país predominantemente agrícola e dependia da mão de obra escrava e a industrialização não havia chegado e nem tinham produto e dinheiro que pudesse fazer essa passagem.
            A partir do tratado comercial entre a Inglaterra e Portugal (1807), se impõe o fim do trafico de escravos e, posteriormente (1826) ao governo brasileiro abolir o trafico em três anos, mas somente em 1831 com a lei Feijó que em tese proibia o tráfico do Atlântico e libertava os escravos que chegavam ao Brasil. Isso ocorreu somente no papel, pois na prática o tráfico continuou acontecendo e somente em 1850 com a Lei Eusébio de Queiroz se pôs fim ao tráfico de escravos.  No entanto a escravidão continuou no território brasileiro até 1888. 
            A pressão Inglesa pela abolição é justificada por diversos motivos que vão desde uma conscientização cristã, ideais iluminista e principalmente econômicos motivados pela Revolução Industrial. A Inglaterra necessitava de ampliar seu mercado consumidor para seus produtos industrializados e somente a classe trabalhadora assalariada tinha poder de compra. O Brasil era o empório da Inglaterra; fornecia matéria prima barata e adquiria produtos industrializados caríssimos, logo a escravidão andava na contramão desse processo, não colaborava com o consumo, sem salários e poder de compra a população negra não representava uma classe consumidora para os ingleses.

            1.4. A escravidão no Segundo Império (1840-1889): mudança de consciência.

            O período de 1848 a 1868 são marcados pela consolidação da autoridade imperial por D. Pedro II e fim das revoltas autonomistas; conflitos internos com a Igreja católica que requisitava maior autonomia nos assuntos eclesiásticos e externos com o vizinho Paraguai que acabou resultando na Guerra do Paraguai (1865-1870), que buscava uma saída marítima para o Atlântico[vi]; e pressões Britânicas devido ao tráfico que continuava existindo. Porém, “uma das facetas mais importantes desse período foi o início da abolição da escravatura” (HAUCK, p. 151). 
            A segunda metade do sec. XIX inicia com a aprovação da Lei Euzébio de Queiroz, que tratava do tráfico negreiro. Esta lei veio por força e imposição dos ingleses devido a Lei Bill Alberdeen de 08 de agosto de 1845. Este ato unilateral permitia que os ingleses abordassem e inspecionassem navios brasileiros em qualquer oceano. Vioti da Costa (p. 37) informa que a partir da segunda metade do sec. XIX começou a se intensificar o movimento pela emancipação dos escravos. Inicialmente nos meios acadêmicos entre os estudantes, escritores e advogados. Na literatura ‘escravo’ foi tema em prosa e em verso. Muitos foram os escritores que se dedicaram a dramatizar o dia a dia dos negros nas senzalas e a escravidão se tornou fonte de inspiração de muitas obras que se tornaram famosas. O escritor que mais se identificou com a sorte dos escravos foi Castro Alves (1847-1871), advogado, poeta e escritor; conhecido como “O poeta dos escravos”, na sua curta vida dedicou-se a levantar fundos para alforrias de escravos e a defendê-los nas cortes de Justiça. Na Guerra do Paraguai, branco e negro, livres e escravos lutaram lado a lado. Os negros com a promessa imperial de conquistarem sua alforria e retornaram vitoriosos. Segundo Hauck (p.153) A GUERRA DO Paraguai fez despertar os sentimentos abolicionistas e valorização dos militares nas decisões do país e vai fortalecer ideal republicano frente à monarquia. Os ideais republicanos eram vistos pela igreja como sinônimo de subversão tendo como promotora a maçonaria.  Acrescente-se a esses sentimentos a isso Lei do Ventre Livre (1871) pôs fim à escravidão dos nascituros e representou a declaração de “brasilidade” dos negros.
            A emancipação dos negros em condição de servir o exército (1866), a emancipação total dos negros da Nação na Lei do Ventre Livre (1871), foi como o início dessa tomada de brasilidade do negro. E esta conscientização de que o negro é também povo brasileiro vai ser decisiva para que a igreja também se conscientize de que o negro é povo de Deus. A discussão em torno da lei do Ventre Livre trouxe a lume o ‘direito de propriedade’ sobre o escravo que para muitos dizia respeito a coisas e não a pessoas.  Nesta época Torres Homem, politico famoso, homem de cor que chegou ao senado depois de brilhante carreira, afirmava:

A propriedade de escrava era uma monstruosidade que violava o direito natural [...]. A maioria dos escravos no Brasil descendia de escravos introduzidos no país por um tráfico não só desumano, como criminoso. Nada mais justo que se tomassem medidas que acabasse com a escravidão (Viotti da Costa, p. 45,46).

Assim, se começa a repensar a situação social do negro na sociedade brasileira. A Lei do Sexagenário, em 1885, que libertava o negro com mais de 60 anos, foi uma tentativa desesperadora de se manter a escravidão. Nessa altura, o povo tinha “arrebatado das mãos da elite a direção do movimento. A Abolição se tornava causa popular, com apoio de diversos setores da camada popular, da classe meia e até da elite” (Viotti da Costa, p. 70,71). Assim o movimento se acentuou a partir de 1880, provocando anarquia social que tomou conta de diversas regiões do país, principalmente em São Paulo, província cafeeira para onde veio grande contingente de escravos. Fugas de escravos, revoltas, invasões de fazendas promovidas por movimentos abolicionistas como os caifazes[vii] que motivavam os pretos a se rebelarem.
            A emancipação negra no Brasil teve como “eixo as razões de ordens político-econômicas, com evidentes apelos de ordem ético-morais, o que não implicava em propor a subversão da ordem constituída”. Não foi pelo resultado do ideal dos movimentos de libertação dos quilombos, mas devido à materialidade de um conjunto de Leis, cujo objetivo era ‘manter a estrutura econômica, político e social e fazer a transição da mão de obra escrava para a livre de maneira mais traumática possível” (FUNES-GONÇAALVES, p. 30). Esta concepção é facilmente vista na Lei do Ventre Livre (1871) que declarava que o nascido a partir daquela data somente alcançava sua liberdade plena aos 21 anos de idade. Ou seja, o ingênuo ainda era explorado até a sua maioridade. Ou seja, até a Lei Áurea ninguém ainda tinha sido beneficiado pela Lei do Ventre Livre; quem nasceu em 1871 ainda estava com 17 anos e precisava trabalhar até os 21.  
            Da Lei do Ventre Livre para a Lei Áurea (1888), foi um longo caminho de exploração, luta e paciência. Quando a sonhada liberdade veio, somente 5% da população era escrava, isto girava em torno de 700 mil negros. Já havia esgotado todos os recursos para manter o sistema escravista; era grande o numero de emigrantes que entraram no país para substituir a mão de obra escrava pela livre, e o negro foi dispensado sem nenhuma recompensa ou indenização. Desempregado, pobre, sem moradia e desletrados, foram morar nos morros do Rio de Janeiro, de Santos e nos subúrbios de São Paulo.  

            1.5. A situação do negro e classificação social no início do séc. XIX.

            A escravidão era uma das instituições mais típicas da sociedade brasileira colonial e imperial. Os escravos eram a peça de maior valor, pois a terra de nada valia sem os escravos. O seu valor aumentava a medida da necessidade do ciclo econômico. Em Minas Gerais, no período do Ciclo do Ouro, e em São Paulo, durante o Ciclo do Café, por exemplo, seu valor alcançou cifras impressionantes. Apesar de seu alto custo os senhores não sabiam aproveitar de modo racional e planejado a força escrava: excessivos trabalhos e horários exagerados, fraca alimentação que produziam baixos rendimentos e alta taxa de mortalidade que superava a de natalidade. O escravo morria cedo e não havia quem cobrasse o cumprimento das leis de proteção que eram desrespeitadas desde o transporte nos navios até pelos castigos e açoites impostos pelos senhores.
Não foram poucas as situações de humilhação que eram submetidos que variava desde conhecerem seu lugar na sociedade dos brancos até a sacralização da submissão aos seus senhores dos quais deveriam pedir a benção. No entanto, houve patrões que tratavam seus escravos com humanidade, promovendo o casamento, dispensando do trabalho a escrava que amamentava, liberando o domingo como descanso semanal e não faltou experiência de tornarem os negros assalariados. A condição do escravo urbano era bem diferente daquele do interior. O custo para mantê-lo era mais caro o que fez surgir muitos negros mendigos e moribundos pelas ruas. Quando ficavam velhos, doentes ou cegos davam-lhes a alforria. A alforria poderia ser comprada pelo escravo com suas próprias economias ou por outros pelo valor estabelecido pelo patrão (HAUCK, p.46, 47).
            As classes sociais no Brasil eram estabelecidas pelo extrato formador que a definia. Em uma sociedade em que a escravidão ocupava lugar de destaque, o trabalho era o primeiro fator formador separando escravos e livres. Esta definição não era bem definida, pois mesmo negros livres e alforriados eram alvos de segregação racial o que lhes impediam ou limitavam a ascensão social. Era fácil perceber como “o negro livre mantinha arraigada a mentalidade de escravo reconhecendo a sua posição na sociedade racista”.
            No segundo degrau social estavam os brancos ricos de influência social; mesmo existindo pretos ricos, não poderiam ser influentes, pois lhes faltava o fator racial. “Cresce o complexo de ser o brasileiro de raça inferior, que por muito tempo vai acompanhar os intelectuais brasileiros” (HAUCK, p. 51). Os mulatos ainda vão ter grande influência na vida nacional, mas somente a partir de 1831 pelo caminho do exercito carregando sempre o complexo racial.    
            A inteligência e cultura também classificavam, mas dificilmente um mulato inteligente, pobre e de cor rompia a barreira. A riqueza era o elemento mais forte de classificação social, por isso os senhores de engenho, os grandes proprietários de terra e os traficantes de escravos tornaram-se os detentores do poder comandando as contrarrevoluções e seriam eles os donos do país após 1831. Era comum a ostentação de riquezas e exibição luxuosa tanto por parte dos senhores com pelos negros.   
            O extrato social de classe ficava assim representado pelo “pequeno número de privilegiados e outro pela massa do povo”.

Entre os privilegiados podem ser colocados: os grandes proprietários rurais, alguns altos escalões do funcionalismo público, por força do prestígio e da influencia; os comerciantes, algumas profissões muito rendosas, como a dos mercadores de escravos; o clero, por dois critérios: participavam os padres da pouca numerosa elite intelectual, e eram representantes da religião que, por ser oficial, lhes dava prestígio de funcionários qualificados e, por ser profundamente arraigada na alma popular, lhes garantia o respeito do povo (HAUCK, p. 53).

Segundo Viotti da Costa (p.17) a “ordem social era considerada expressão dos desíguinios da Providência Divina, portanto não era questionada”. Naquela época, acreditavam que “era a vontade de Deu que uns nascessem pobres, outros ricos; uns livres e outros escravos, e que não cabia aos homens modificar a ordem social”.
O discurso a respeito dos negros está dialeticamente relacionado à sua posição social na sociedade. Os negros eram os últimos na escala social, logo seus interesses também. Completamente engolido pelo sistema escravista sua voz não era ouvida. Nesse caso, precisava que alguém de uma escala acima falasse por eles. Esperava que a Igreja cumprisse esse papel, mas na sua prática social em relação ao negro, encontramos seu discurso e sua posição como também já vimos. Assim, os acontecimentos externos colaboraram; a proibição do tráfico, a Guerra do Paraguai os abolicionistas juntamente com a opinião da qualidade da mão de obra escrava. Na medida em que a sociedade mudou sua maneira de pensar o discurso com relação ao negro também foi ganhando força, até que no final a Igreja emprestou sua voz de forma apática. 

CAPÍTULO DOIS 

11. A IGREJA E A ABOLIÇÃO

 2.1 A Igreja e abolição e sua relação com o negro.

            João F. Hauck (p.274) afirma que para entendermos o papel da Igreja no processo de emancipação e posteriormente na luta pela abolição é necessário ter em vista “as bases sociais do império se assentavam sobre a coroa, escravidão e proprietários de terra, e que a Igreja constituiu a base espiritual do todo e viveram intimamente entrelaçadas entre as três instituições”. Nesse mesmo raciocínio, Viotti da Costa (p.17) declara “justificada pela religião e sancionada pela Igreja e pelo Estado que a escravidão não era questionada”. A igreja se limitava a recomendar paciência aos escravos e benevolências aos senhores. Hauck complementa dizendo que a igreja foi “o cimento moral que deu consistência, que deu aliança entre os três elementos”.
            Ney Santos afirma também que a Igreja “não estava preocupada com os problemas concretos com a população da terra” e cita o abolicionista Joaquim Nabuco que afirmou: “eu tinha sempre lastimado a neutralidade do clero perante a escravidão, o seu indiferentismo no contato com ela”.[viii] Segundo Riolando Azzi (1989. p.55) a obra do médico baiano Luiz Anselmo da Fonseca tinha por objetivo “cobrar da Igreja Católica, uma instituição declaradamente comprometida com a fraternidade, uma atuação mais significativa na campanha em prol da abolição. Ao mesmo tempo passava a denunciar a grande omissão do clero nesse tempo”. Nessa mesma obra, Azzi afirma seu parecer sobre a omissão da Igreja no processo de abolição. Para ele a causa dessa fraca presença católica se deve principalmente por dois motivos na grave crise que perpassava a igreja: 1) seja pela decadência e desagregação do modelo de cristianismo vigente no império; 2) seja pela afirmação progressiva do modelo trinitino.  
            Resumindo as afirmações de Riolando Azzi, todo o período imperial foi tenso para a Igreja em sua relação com o Estado. A Igreja continuava atrelada ao Estado e não tinha autonomia para realizar qualquer reforma sem autorização da coroa. Os pensadores liberais da classe letrada que poderiam liderar o movimento de emancipação (teve início com José Bonifácio em sua Representação à Constituição, mas foi rejeitado por D. Pedro I), durante o Primeiro Império, foram perseguidos e afastados de suas funções, transferidos e ameaçados. No período Regencial foram combatidos pelos latifundiários e no Segundo Império, D. Pedro II procurou nomear bispos conservadores afastando os liberais. Logo, a reforma promovida pela Igreja foi clerical com formação de padres comprometidos com o sacerdócio e não com política e em catequizar o povo nos sacramentos da Igreja. Paralelo a isso havia a pressão do Pontífice de Roma para estabelecer modelo Tridentino na Igreja brasileira que leva bispos a expulsar padres e pessoas que tinham relações com a maçonaria. O que levou a um conflito com o Estado na chamada Questão Religioso, além disso, houve o sucateamento por parte do Estado nas Ordens Religiosas que ficaram impedidas de recompor seus membros. Isto levou ao envelhecimento das ordens femininas e masculinas gerando adoecimento e debilidades, sem motivação e forças para promover empenho efetivo em prol dos problemas socais e um compromisso sério com a causa abolicionista.
Logo, a Igreja estava muito debilitada internamente e via sua esperança na implantação do modelo tridentino que “cujas metas muitos se distanciava da realidade brasileira [...]. Ao lado da crise da Igreja Imperial inspirada no modelo de cristandade, também a estruturação do novo modelo tridentino constitui um elemento determinante para o pouco interesse da instituição católica com relação ao problema da abolição” (AZZI, 1989. p.55-70).
‘A Igreja e o Estado de braço dado como dois soldados, caminhavam lado a lado com a escravidão; tinha nas mãos o poder da alforria. Que bom seria se tivessem paixão’. Estes meus versos bem classificariam o que Hauck esclarece sobre a aliança entre a coroa e a mitra:

A coroa esteve unida pelo regime do padroado e ao Estado pelo fato de ser sua religião oficial, sendo os seus ministros, funcionários do império, de quem recebiam subsistência. À grande propriedade delegou a Igreja a tarefa pastoral de catequizar os escravos e de organizar e animar sua vida religiosa (HAUCK, 274).

E mais, o reconhecido autor afirma que a Igreja “assentou sua base material”, principalmente às ordens religiosas (carmelitas, beneditinas, mercedários e jesuítas), na exploração de grandes propriedades de terra, na produção (cana de açúcar), na comercialização (mercado exterior) e no mesmo regime de trabalho (centenas de escravos). Assim, a Igreja através das ordens religiosas endossava o regime escravista ao compactuar com o sistema escravocrata e atuar como senhores de escravo. Havia uma consciência de que “não condizem com a condição religiosa e eclesiástica o uso e a posse de escravos”. Os carmelitas se justificavam que os beneditinos e outros religiosos possuíam engenhos de açúcar e por consequência, escravos. Quando questionados para a emancipação e libertação, os religiosos estavam preocupados com o prejuízo financeiro que sofreriam. Desta forma, o processo de emancipação no início foi lento e gradual. Os franciscanos comercializavam escravos livremente e somente no fim de 1859 resolveram dar liberdade aos “escravos mais bem-comportados” com mais de 60 anos e as escravas com mais de 50 anos que “tivessem dados aos conventos cinco filhos” o exemplo é seguido pelos beneditinos que liberaram as escravas que dera mais de seis filhos e em 1866 resolvem dar liberdade a todos os nascidos em 03 de maio de qualquer ano e os que nascessem após aquela data. Mas, o maior gesto profético veio dos beneditinos, ocorreu um dia após a Lei do Ventre Livre de 28 de setembro de 1871 quando resolveram conceder liberdade a todos seus escravos, num total de 4.000, sem nenhuma indenização ou compensação pelos trabalhos prestados (HAUCK, p.274, 275). No entanto, nem todas as ordens religiosas seguiram o exemplo dos beneditinos, apesar dos apelos dos bispos em 1887 ocorridos às vésperas da Lei Áurea, para libertarem seus cativos antes que o fizessem por força da lei e assim não receberiam nenhum reconhecimento da sociedade. O frade carmelita, Frei Caetano negou libertar seus cativos, desobedecendo à orientação de seu bispo, D. Alvarenga, alegando que o Governo indenizaria os senhores. “Tão agarrado que estava aos bens temporais, viram libertos por lei todos seus escravos e a sonhada indenização nunca aconteceram, como também não veio o reconhecimento por parte dos escravos que abandonaram as fazendas da ordem, deixando na miséria o frade” (p.276).
             Os esforços abolicionistas vinham da ala da política liberal abolicionista na Assembleia e no Senado, de escritores e jornalistas e associações abolicionistas que aqui e ali serviu como voz da libertação (VIOTTI DA COSTA, p.37-40). A disputa mais acirrada se deu no campo político, na Assembleia de Deputados, cuja maioria era representante de grandes fazendeiros com grande contingente de escravos. Logo, aprovar qualquer projeto emancipacionista era uma tarefa quase impossível (VIOTTI DA COSSTA, p. 41-43).
Quando o clero se manifestava, quase sempre eram favoráveis aos interesses da classe dominante escravista e procuravam eximir a Igreja de responder pelo problema do negro. Esse foi o caso do bispo do Rio de Janeiro, D. Pedro Maria de Lacerda, amigo da família real em sua carta pastoral sobre a Lei do Ventre Livre de 28 de setembro de 1871. Segundo Hauck (p.277), esta carta nos dá a ideia da “medida exata da posição da Igreja perante a questão da emancipação”. A carta expressa o pensamento de um alto clero da corte: “alargaram-se os horizontes de uma bem entendida liberdade em nossa querida pátria Brasil (...). O que, porém, sobrepujam todas essas circunstâncias, é que não foram contrariadas as leis de Deus nem as de sua Santa Igreja”. O bispo invoca o feito como um ato de profunda gratidão e generosidade de seus promulgadores:

Nos braços da Cruz foi rasgado o [chitographo] que condenava a nascerem no captiveiro tantas futuras gerações de homens e foi parada e recuada até o abysmo por peitos brasileiros essa entumecida e arrebatada correnteza que há 371 anos arrastava e ainda ameaçava rolar em suas negras ondas a milhares de homens que deviam um dia nascer na terra americana do Império da Santa Cruz de Jesus Christo (RAUCK, p.277).··p

O bispo pede aos negros que se alegrem com a liberdade concedida aos que virão a nascer livres e que continuem sendo obedientes aos seus senhores com amor dobrado “porque o temor deve ser substituído pelo agradecimento” e que deviam provar a “vossa dedicação e obediência, defendendo os vossos senhores e a tudo que lhes pertence”. O bispo dirige a palavra aos senhores pedindo que eles não devessem pôr obstáculos à execução da Lei e que as criancinhas fossem tratadas com o devido respeito e não deixasse que as mães sofressem qualquer tipo de tribulação: “Não permitais que os desmazelos, a inveja, a miséria ou o desespero levem as mães ao aborto, ao infanticídio, ao abandono dessas criancinhas inocentes e desvalidas; não as deixes sucumbir pelas tribulações”. Em nenhum momento, afirma Hauck, o bispo D. Lacerda não reconhece o direito natural do negro pela liberdade como o fez o Papa Leão XIII: “É coisa salutar restituir pelo benefício da alforria à liberdade em que nasceram os homens que a natureza fizera livres desde o início” (grifo meu). D. Lacerda não contesta a legitimidade da escravidão nem afirma o direito natural do escravo à liberdade. Os fazendeiros deveriam acatar e não questionar, pois ao se opor à lei, estavam desobedecendo e se opondo a Deus, e não era o que a Igreja ensina e que foi “legalmente decretada e promulgada”. Comenta Hauck que enquanto projeto de lei “era lícito questionar, mas agora que é lei a religião e o Estado exige a sua execução”.  Desta forma, a Igreja se alinhava a clássica argumentação escravocrata: “os escravos eram sua legitima propriedade. Toda propriedade privada era sagrada e inviolável” (HAUCK, p.277).
            A carta ressaltou a importância da Lei do Ventre Livre que valou ao bispo futuramente em 13 de maio o título de Conde de Santa Fé concedido pela princesa. Sobre as declarações desta carta pastoral de D. Lacerda, ainda falaremos mais para frente numa comparação com a teologia bíblica sobre escravidão e sua legitimidade e regulamentos.

 a.    A Igreja no processo de emancipação e nos movimentos abolicionistas

            O movimento abolicionista ganha força a partir de 1879-1888 e empolgou o país, todavia a participação da Igreja era feita a distância e quase indiferente, sem nenhuma ligação íntima com o abolicionismo. Somente às vésperas da abolição, através das cartas pastorais de 1887, que houve alguma movimentação do prelado a favor da abolição. Esta ausência de interesse do clero católico foi alvo de muitas críticas por parte dos principais ícones abolicionistas como Joaquim Nabuco, que expressou seus sentimentos assim: “[...] Eu tinha sempre lastimado a neutralidade do clero perante a escravidão, o indiferentismo de seu contato com ela...”.
            No seu artigo ao Jornal O País, Joaquim Nabuco fala da influência que os missionários católicos têm no interior do país sobre a classe pobre e exclama:

[...] que efeito prodigioso não faria a palavra do sacerdote que realmente pregasse a moral social do evangelho! Mas onde já se viu um missionário abolicionista! [...] ainda não houve no Brasil um bispo que levantassem a voz contra a escravidão, como os houve para levantar a voz contra a maçonaria, apesar de estar a escravidão mais condenada por bulas pontificais – e por concílios – do que a maçonaria (HAUCK, p. 279).

Oficialmente o abolicionismo não foi assunto do gosto do prelado católico devido sua ligação direta com os interesses dos grandes latifundiários, mas não faltaram atos individuais isolados que acabaram caindo no vazio, “por falta de oportunidade histórica ou por não estarem articulados com um movimento social” (RAUCK, p.279).
            Como destaque, Hauck (p. 279) apresenta alguns nomes importantes como do “bispo de Diamantina” (1863-1905), Dom João Antônio dos santos, que em 1846 na Selecta Católica de Mariana e em 1862 no Jequitinhonha de Diamantina, lutou pela libertação, esforçando ao máximo para conseguir a libertação, chegou a percorrer sua cidade episcopal suplicando a alforria legal dos escravos. No site da Arquidiocese de Diamantina[ix], há a informação de que o bispo de Diamantina durante seu governo “lutou incansavelmente pela abolição da escravatura” e que “pessoalmente alforriou mais de dois mil escravos na região”. Dom João Antônio dos Santos, bispo da diocese de Diamantina em Minas Gerais parece ser uma exceção. 

b.    Diamantina: emancipação mineira e o desenvolvimento    local.

            Segundo Lívia Gabriele de Oliveira (p. 11) “Assumidamente a favor da abolição dos escravos, ele divulgou seus ideais emancipacionistas em jornais e em pastorais. Entre suas ações a favor da liberdade, a mais significativa, além da pastoral de 1887, foi a criação da Sociedade Patrocínio Nossa Senhora das Mercês (SPNSM), em 1870”, em consórcio com o Fundo de Emancipação Municipal[x]. Não somente porque levantava fundos para liberação dos escravos, mas por que criou um ideário emancipacionista naquela região. Se a Igreja Católica era representante do Estado, como se dava a crítica à escravidão por um de seus membros? Se o bispo era abolicionista quais as ações que poderia caracterizá-lo como tal? Como se comportaram as alforrias enquanto esteve à frente do bispado? São perguntas que Lívia Oliveira (p.12) faz e responde no seu estudo com relação ao trabalho do bispo de Diamantina.  A autora continua: “A legitimação do poder que a igreja exerceu sobre a sociedade era feito por meio do bispo”. Era a mais preparada na formação de fé, religião, poder, conhecedor da sociedade, de obediência a romanização a as leis brasileiras. Capaz de influenciar o clero e a sociedade a seguir determinado comportamento.
Em muitas regiões isoladas, a Igreja Católica era o único representante do Estado; extensão da sua vontade por força do Padroado Régio. O isolamento parece não ser o caso do norte de Minas e principalmente em Diamantina, pois era uma região rica em minério, pedras preciosas e agricultura. Ações positivas como do bispo D. João Antônio dos Santos sem perder o prestígio junto ao Estado e proprietários só encontram explicação nas relações políticas, culturais e econômicas e têm “propostas de ordem e organização da sociedade que foram intensificadas pela fé”.
            A resposta aos resultados positivos de D. João Antônio dos Santos, não estavam somente no fato do uso dos Fundos locais e do governo para libertação do elemento servil, mas está em quem projetou e organizou sua diocese para atender tanto os assuntos espirituais como de interesses econômicos da região que passava por crise e por um período de transição de setor econômico. A mineração estava em baixa, uma crise se instalava e era necessário fazer a transição para a industrialização e diversificar as atividades agrícolas: substituir a mão de obra escrava para a honesta. O que Oliveira (p. 84, 85) destaca é que todas as instituições constituídas (jornais, sociedades civis, Fundos Municipais e do Governo) pela sociedade civil local estavam ligadas a Igreja. “Isso porque a presença do bispo nas comissões administrativas e a sua influência sempre se fazia presente”. 

c.    Os jornais no processo de emancipação.

            Os jornais foram os veículos de maior contribuição para o movimento emancipacionista em Minas Gerais. Em Diamantina destacaram várias folhas com ‘’O Jequitinhonha’ e ‘Sete de Setembro’.[xi] Nos jornais eram noticiados os nomes do elemento servil alforriado: crianças, mulheres e homens beneficiados pelo Fundo de Emancipação e indenização aos proprietários prevista na Lei do Ventre livre. “O movimento começou tímido e alcançou proprietários, comerciantes e os letrados da região” (OLIVEIRA, p.32).  
Os jornais da região tiveram papel fundamental na opinião pública da região:

O jornal Jequitinhonha publicava discussões sobre o fim da escravidão em diversos países sobre a postura do Imperador do Brasil quanto ao abolicionismo, o encaminhamento dos projetos de leis, as condições de vida dos escravos e libertos, a posição a Igreja, assinada algumas vezes, pelo próprio bispo diocesano (...). A igreja divulgava o quão era nobre a abolição, mas sempre com o cuidado de manter-se dentro da lei do império, condenando as fugas e as revoltas (Oliveira, p.32).

            L
Lívia Oliveira (p. 85) destaca um artigo do Jornal Jequitinhonha falando sobre o sermão do Padre Sypolis com clara associação à carta de Filemom. Entre linhas, o artigo descreve que “com palavras de mestre descreveu o progresso e desenvolvimento da escravidão em todos os povos” e continua:

Manifestou os passos do cristianismo para quebrar as algemas do cativeiro. Falou aos corações dos senhores e a humildade dos escravos. Aos senhores disse que deviam amar os escravos como seus irmãos em Jesus Cristo; considerai-os como membros de sua família. Aos escravos que deviam toda obediência e humildade aos seus senhores, mesmo estando irados. “A emancipação deveria começar pela moralização dos escravos” (OLIVEIRA, p.85).

Numa rara comparação com a carta a Filemom; o padre afirma que esta moralização é como que o escravo fosse visitar seu padrinho em São Paulo. “Ele agasalha, instrui, batiza, moraliza o escravo e o manda para o seu senhor; ‘recebe-o como recebais a mim, o meu coração, as minhas entranhas” [xii].
            Lívia Oliveira (p.89) informa que os escravos deveriam saber que a liberdade não vinha das mãos do governo ou por suas próprias mãos, mas que conseguiriam a alforria de um ato de benevolência e caridade de seus senhores. Muito embora, o bispo de Diamantina tivesse notória participação junto ao Governo na idealização e aprovação da lei do Ventre Livre[xiii] que na sua diocese já acontecia como ato de caridade na pia batismal, ou seja, o que já era um acontecimento em Diamantina e região se tornou uma lei para o país. Em parte, o que veio a ser a Lei do Ventre Livre era uma das propostas emancipacionista da SPNSM e que já ocorria na região de Diamantina.
            Devemos considerar as atitudes positivas como emancipação oferecida pelas ordens católicas. Por determinação dos bispos foram obrigadas a alforriar seus escravos, pois eram acusadas pelos abolicionistas de que o cristianismo não era compatível com a escravidão, inclusive pelo jornal “O Abolicionista” de darem péssimo exemplo ao serem ‘senhores de escravos’; isto é, havia um envolvimento direto da Igreja com a escravidão, logo o seu discurso favorável à emancipação dos escravos ficava comprometida.
            O esforço da Igreja na emancipação do elemento servil se traduziu de forma materializadoras em alforrias nas cartas de liberdade, nas pias batismais e nos testamentos. “De acordo com as praticas cristãs, remir o cativo era uma forma de praticar a caridade e com isso alcançar a salvação”. A garantia pela salvação pode ser uma das explicações pela grande alforria testamentárias institucionais (OLIVEIRA, p. 33). A participação da Igreja Católica no movimento de emancipação é resumida na afirmação de Pedrosa: “A atuação oficial da Igreja seria caracterizada por alguns lampejos de coragem e generosidade, mas a melancólica e quase tardia no seu conjunto [...]” (PEDROSA, p. 7) [xiv].
            Em 1888, às vésperas da abolição o papa Leão XIII participa direta e indiretamente do processo de abolição. Indiretamente porque os bispos pediram aos senhores de escravos uma ‘prenda’ em comemoração ao Jubileu do papa (31/12/1887); os bispos pediram que fosse oferecida liberdade aos escravos e centenas de escravos receberam o beneficio.
Diretamente porque se manifestou favorável à emancipação em seu discurso por ocasião da comemoração de seu Jubileu ao enviado especial o Ministro João Artur de Souza Correia, em 14 de janeiro de 1888 e depois em 10 de fevereiro de 1888. Numa audiência com o deputado Joaquim Nabuco, abolicionista que fora pedir ao papa “uma palavra favorável à abolição”. A resposta do papa veio através da encíclica ln Plurimis de 08 de maio de 1888 que somete chegou às mãos dos bispos brasileiros após a assinatura da Lei Áurea.

d.    As cartas pastorais.

As castas pastorais foram instrumentos vastamente utilizados pelos bispos no período imperial para transmitir suas ideias, fazer os seus apelos e administrar a Igreja dentro daquilo que acreditavam ser correto.

Por meio das pastorais, portanto, podemos acompanhar o pensamento da Igreja Católica – manifestado nas palavras dos Bispos e do modo como foi transmitido aos fiéis – durante um período significativo de sua atuação no Brasil e perceber os argumentos e estratégias utilizados por esta instituição para garantir uma efetiva influência sobre a religiosidade, a política e a cultura do país (CAES, p.02).

Desta forma, vamos encontrar nelas raízes do pensamento doutrinário da cristandade no período colonial em relação a diversos assuntos, e neste caso com relação à escravidão.  Em alguns casos o pensamento está totalmente descoberto, mas em outros precisamos interpretar nas entre linhas.  Como vimos a igreja estava profundamente ligada aos interesses do Estado e dos grandes proprietários de escravos.
            Uma Igreja elitizada desinteressada pelas necessidades dos pobres e principalmente porque a abolição não fazia parte dos seus planos, exceto em alguns casos particulares como já foi exposto; mas não se tratava de um assunto tratado a nível nacional.  

CAPÍTULO TRÊS

12. A TEOLOGIA E A ESCRAVIDÃO 

3.1.  Catolicismo brasileiro: religião oficial e formação da teologia.

            O catolicismo foi a realidade religiosa oficial do Brasil desde sua colonização e continuou no Brasil Império (1822-1889), primeiro por força da Constituição de 1824 no seu art. 05:
A religião católica apostólica romana continuará sendo a religião do Império. Todas as outras religiões serão permitidas com seu culto doméstico ou particular, em casas para isso destinadas, sem forma alguma exterior de templo”.
            O proselitismo e as construções de templos não eram permitidos, o que impedia o crescimento do protestantismo. Depois por tradição ibérica e imposição do clero católico que via no sistema padroado a saída para a dominação religiosa territorial.
             O regime de Padroado[xv] continuou existindo no primeiro reinado do Brasil e controlava a administração e os assuntos eclesiásticos católicos.
Para Ney Souza (p.129) o padroado teve dois momentos no Brasil: o primeiro que vai de 1826 até 1840 com o início do segundo reinado. Era uma igreja nacional totalmente controlada pelo rei e posteriormente pelo Regente Feijó que exercia poder que permitia controlar os assuntos da igreja: nomear bispos e prover outras funções eclesiásticas; conceder ou negar beneplácitos régios aos decretos papais antes de serem divulgados no Brasil. O papa era reconhecido como chefe honorífico, mas sem uma efetiva participação sobre os assuntos da Igreja Nacional. E, o segundo período de 1840 até a Proclamação da Republica em 1889. Nesta fase se verifica grande mudança na relação Igreja e Estado, “principalmente no pensamento católico do que são as atribuições dos negócios eclesiásticos”. 
            A primeira fase do Império (1826-1840) foi fundamental para a formação do pensamento teológico católico brasileiro, por ser um período de continuação da dominação do poder civil sobre o eclesiástico (padroado) que chega ser uma dominação e controle de quase opressão, visto que o Estado retardava os negócios da Igreja e os clérigos não passavam de funcionários públicos em vez de ministros da igreja Católica. Segundo Ney Santos (p.130, 131), essa condição influenciava no pensamento ministerial do clero: “Tal fenômeno não deixaria de influir na mentalidade dos sacerdotes e em suas atividades pastorais, bloqueando sua capacidade de iniciativas e sujeitando-os a rotina de trabalhos oficiais e sistematicamente controlado pelo Estado”. Dessa condição que se mostrou ambígua para a Igreja vai surgir uma nova teologia que levará a grandes divergências entre o poder espiritual e o temporal que vai resultar na “Questão Religiosa (1872-1874) e finalmente a separação entre Estado e Igreja pela Proclamação da Republica em 1889”.
            O período em foco estava sob Regência do Padre Diogo Antônio Feijó (1784-1843) [xvi], quando esteve à frente do país por duas ocasiões; período marcado por inúmeras revoltas e revoluções populares e pela baixa credibilidade do clero junto ao povo provocado pelo distanciamento da igreja; devido à escassez de padre, concubinato de padres e com família e a indolência ministerial, por causa disso se ansiava por reformas no corpo clerical e dos objetivos missionários da igreja e sua autonomia como instituição nacional.  
            Sobre este período, segundo Ney Santos (p.132), o que é importante para a “teologia no império é a percepção que estes pensamentos, projetos e práticas estão alicerçados na doutrina galicanas e febronianas[xvii], preconizando assim uma igreja nacional”. Toda esta ambientação política e religiosa vai preconizar na mentalidade teológica desfavorável à abolição dos escravos calcada na sociedade de dominação branca.
            A afirmação de Ângela Rodholfo Paiva falando sobre “Catolicismo brasileiro: harmonia no reforço da desigualdade” escreve:

A esfera religiosa no Brasil vai adquirindo idiossincrasia que lhe confere identidade própria, sendo mesmo mais apropriada falar em “catolicismo brasileiro”. De certa maneira, a prática religiosa vai exacerbar as características mais marcantes do catolicismo trazido de Portugal em virtude dos acontecimentos específicos na história brasileira (PAIVA, p.44).

            Os agentes externos para a formação do pensamento católico em relação ao negro estão dialeticamente relacionados à ambição portuguesa para a colonização de seus territórios, e no período monárquico este pensamento não era diferente. A necessidade da mão de obra escrava, os interesses dos grandes proprietários de terra e senhores de escravos em uma nação exclusivamente agrária reforçada pelo pensamento católico português da desvalorização da raça negra e a busca ambiciosa do enriquecimento pessoal. A combinação ou a somatória desses fatores vão se tornar barreiras intransponíveis para a libertação dos negros.
            O catolicismo, desde o século XVI, é a marca da vida social brasileira. Souza afirma que “Não se entendia a realidade sem uma explícita referência ao transcendente e à Igreja Católica, esta última vista como representação visível da divindade” (Souza, p. 129). A vida religiosa estava presente em todas as esferas estruturais da sociedade, seja nas dimensões públicas e oficiais, nas domésticas e pessoais. Souza (p.130) afirma que “nesse tipo de cristandade, as esferas cíveis e eclesiásticas praticamente se identificam, e o cidadão é obrigatoriamente cristão. Há uma sacralização das estruturas sociais e politicas. Estará neste ponto a raiz do processo de dessacralização do sagrado”.   
            Na segunda fase do império de 1840 até a Proclamação da Republica em 1889 se verificou considerável mudança na relação Igreja e Estado, “principalmente no pensamento católico do que são as atribuições dos negócios eclesiásticos”.
            Para entender o pensamento teológico católico no Brasil do Segundo Império, é necessário perpassar pelos fatos políticos e religiosos dominantes no Primeiro Império que teve implicações próprias de uma Igreja Nacional com a ausência da dominação papal. No Segundo Império aconteceu uma mudança drástica no governo da Igreja. Começando pelas ações adotadas pelos papas Gregório XVI (1831-1846) e Pio IX (1846 - 1878) com objetivo de combater “o pensamento científico, restaurar valores da sociedade medieval, inclusive princípios filosóficos e teológicos, apregoou a necessidade de subordinação do homem à ordem sobrenatural”. Combater os pensamentos revolucionários e modernos e trazer a igreja sob o domínio Ultramontano[xviii]. As pregações são voltadas para a humildade e obediência a hierarquia a autoridade eclesiástica.    No Brasil nesse período do Segundo Império os bispos reformadores foram lentamente introduzindo as orientações papais de uma igreja segundo o modelo do Concilio de Trento e preocupada com a evangelização do fieis; para isto, foi opondo as ações do rei, ao clero liberal que desde o início do império sustentava a ideia de uma igreja regalista e submissa ao poder imperial; combateram a maçonaria dentro da igreja, formaram e nomearam padres em diversas dioceses. Para contrabalançar o rei procurava nomear somente bispos que tinham vínculo, “tendência conservadora”. Assim, o bispo encontrou espaço para se manifestar em diversas dioceses do país. Envolveram-se a imprensa e considerável parcela da população; foi um período de profundas tensões entre o governo e a igreja que abalaram a monarquia, uma das grandes tensões foi a chamada Questão Religiosa (1872-1875), cujo epicentro dessa tensão foi a proibição do clero na participação da maçonaria ou em qualquer cerimônia maçônica. Daí se desenrolou um conflito envolvendo a maçonaria e dois bispos: o bispo de Olinda, D. Vital, e do Pará, D. Antônio de Macedo Costa (SANTOS, p. 136).
O jornal de D. Vital, A União, publicou artigos que “criticavam a liberdade de culto e pensamento, a separação entre igreja e Estado e colocava a Igreja acima do poder civil, ao insistir que as leis dos homens não podiam ser distinguidas das leis de Deus”. O fato é que o ‘caldo engrossou’ entre a maçonaria e a Igreja. A tipografia do jornal ‘A União’ invadida e um padre morto a facada. O bispo havia lançado um interdito a duas capelas de irmandade que se recusava a expulsar os confrades maçons. O rei interveio, mas suas ordens não foram compridas, pois afirmavam que fora por ordem do papa. Toda decisão, ordem, etc. do sumo pontífice deveria passar pelo beneplácito do rei. Foi neste sentido que os adversários aproveitaram para afirmar que o papa estava intervindo em assunto nacional. O bispo D. Vital foi preso juntamente com o bispo do Pará D. Antônio Macedo Costa, e ambos, condenados às penas de quatro anos em trabalhos forçados. Em 1875 a pena foi revogada e os bispos anistiados chegando ao fim a Questão Religiosa. No entanto, no final a monarquia saiu enfraquecida e desacreditada. A hierarquia clerical se mostrou “intransigente a certas medidas de caráter secular e a reinvidicação de conservar o lugar privilegiado no plano espiritual que sempre detiveram junto ao poder” (SANTOS, p. 137). 
            As reformas realizadas pelos bispos nesse período foram estritamente de cunho clerical, seus objetivos era um padre santo e reto, comprometido com a ordem espiritual e inteiramente voltado para as coisas do alto. O celibato deveria ser observado como condição necessária para a ideal missão evangelizadora de uma população de fieis que vivenciava uma religiosidade classificada como fanática e supersticiosa. Era necessário, portanto restaurar a religiosidade nos ditames do culto oficial e às normas romanas.  Santos (p.137) salienta que não é possível generalizar a situação problemática de grande parte do clero, pois poderia se pensar que somente depois da reforma que o clero entrou na via reta. Segundo Ney Santos (p. 139), o que se verifica nesse Segundo Império (1840-1889) é a “participação nula do clero nos movimentos de abolição e no processo de Proclamação da República liderado pela burguesia liberal. Portanto, não houve até aqui um projeto social que envolvesse tanto o pobre como escravo como fim último da missão da Igreja”. 

a.    A evangelização católica e a doutrina escravista em perspectiva histórica.

            O catolicismo no Brasil do séc. XIX em suas relações favoráveis à escravidão, não advém da orientação bíblica do Pentateuco segundo a Lei de Moises ou da posição cristã do Novo Testamento, mas está relacionada a uma construção histórica envolvendo política, economia e principalmente teologia católica como já foi descrito aqui. De uma construção histórica por que o catolicismo desde seus primórdios teceu relações íntimas com o poder temporal.
            Resumindo, o Reino de Portugal surge politicamente e territorialmente no séc XII e economicamente através do comércio marítimo na costa da África ainda no séc. XV. Sua relação com o catolicismo se destaca após a criação da Ordem de Cristo[xix] (remanescentes dos Cavaleiros Templários), com fins religiosos e militares, soldados e missionários conquistadores a serviço da coroa portuguesa.
            As raízes da formação do pensamento favorável à escravidão, da legitimação à permissão da escravidão africana tem origem bem antes de 1500 e bem longe do território brasileiro. Começa com as conquistas portuguesas e principalmente com o infante Dom Henrique, o navegador (1394-1460) e grão-mestre da Ordem de Cristo, que fez de Portugal uma potência marítima.
            Segundo Eduardo Hoornaert (p.32) o ‘sucesso’ das expedições da Ordem de Cristo “trouxe as portas do reino preciosas mercadorias nunca dantes vistas: ouro, marfim, tintas, pimenta, açúcar e finalmente em 1441, escravos africanos”. Em 1443, a ‘expedição de Lançarote “trouxe para Portugal 245 escravos, onde 46 dos quais foram dados ao infante que prontamente ofertou à Igreja de Lagos”. 
            Em nome da coroa de Portugal e da Igreja, a Ordem de Cristo combateu contra os Sarracenos ao norte da África estabelecendo domínio territorial para Portugal ao longo da costa africana e levando o catolicismo aos povos pagãos. A conquista e dominação territorial vai se confundir com evangelizar e tornou um meio de forma de expansão do catolicismo.  Sob a sombra do brasão da Cruz da Ordem estampados nas velas e de carona nas caravelas, os missionários católicos romanos encontraram amparo e solução para expandir seus domínios territoriais, visto que na Europa estava perdendo terreno para os protestantes e no norte da África e na Ásia Menor para o Islamismo.

b.    Expansão territorial e evangelização do negro.

            Dr. Vasconcelos (p.40) escrevendo sobre a evangelização católica em território brasileiro faz a seguinte referencia: “A expansão dos interesses econômicos da coroa portuguesa se confundia com a expansão do catolicismo. A conversão ao cristianismo se confundia com submissão à coroa portuguesa: aceitar ao evangelho, anunciado pelos missionários era ao mesmo tempo aceitar a coroa” (VASCONCELOS, p.40).[xx]
            Muitos autores destacam que os negros capturados eram batizados antes mesmo de embarcarem para o Brasil ou quando chegavam a portos brasileiros antes de serem vendidos aos engenhos. Dom João II (1455-1495) ordenou que os negros fossem marcados a ferro-quente como prova de o imposto já havia sido pago na África e esta marca servia como prova de certificado de batismo cristão, posteriormente Dom João IV (1604-1656) substitui a marca por uma argola pendurada no pescoço que tinha o mesmo objetivo. A alma do negro sem o batismo era vista como habitação de demônios (VASCONCELOS, p. 41) [xxi].
            Segundo Viotti da Costa (p.17) “muitos chegaram a justificar a escravidão, argumentando que graças a ela o negro era resgatado da ignorância em que vivia e convertido ao cristianismo e que a conversão libertava os negros do pecado e lhes abria a porta da salvação eterna”.
            Na África e no Brasil o negro era visto como mercadoria, moeda corrente e objeto de troca, necessário para o trabalho e continuidade do projeto colonizador português, inclusive das missões jesuítas que foram se instalando no litoral brasileiro na medida da necessidade expansionista colonizadora e não por uma demanda missionária. O sistema colonizador português não supria as necessidades financeiras das missões jesuítas, e por isso precisavam se manter de modo independente. Viram nas fazendas produtivas a forma de independência financeira do regime de padroado e para suprir a demanda de mão de obra nas fazendas necessitavam de escravos. A igreja que libertava, também escravizava; isso só é possível entender dentro daquele contexto do sistema colonial. Em via de regra, o discurso era: “Não se encontra gente de trabalho para se contratar: o único remédio é ter escravos”. Esta foi a declaração do Padre Serrão. O Pe Manuel da Nobrega de Olinda, em 1551 pediu escravos ao rei D. João III com a finalidade de manter a missão.
             Para a subsistência da missão foi necessário (no ano de 1568) a congregação provincial de Portugal aprovar a escravização africana; e em 1576 a proibição da Companhia de Francisco de Borja para a escravização indígena foi cancelada com a devida ‘participação humanitária’ do Padre Anchieta conhecida universalmente. Sob os argumentos de não haver mão de obra livre para manter as missões, mas na realidade a escravidão foi sendo introduzida e tolerada entre os religiosos. Não passou muito tempo para que o comércio e o tráfico acontecessem entre os jesuítas e religiosos (HOORNAERT, p. 36-40).
            Foi este contágio com materialismo o lamento de Joaquim Nabuco em seu livro ‘O abolicionismo’ escrito no final do séc. XIX, como informa Eduardo Hoornaert:

[...] que efeito prodigioso não faria a palavra do sacerdote que realmente pregasse a moral social do evangelho! Mas onde já se viu um missionário abolicionista! [...] ainda não houve no Brasil um bispo que levantassem a voz contra a escravidão, como os houve para levantar a voz contra a maçonaria, apesar de estar à escravidão mais condenadas por bulas pontíficiais – e por concílios – do que a maçonaria (HAUCK, p. 279).

 Desde o séc. XVI, o negro começa a fazer parte do projeto português de exploração e colonização e a ser incorporado ao projeto das missões religiosas. Naquela época os padres eram isentos das tarifas alfandegários cobrados sobre os escravos que adquiriam.    
            Dessa forma, o conceito de evangelização aos povos não alcançados não surge de uma conscientização bíblica apostólica integral, mas surge no contexto colonizador português de exploração e dominação geográfica característica daquela época histórica que se apresentava no mundo europeu, juntamente com o cristianismo daquele momento com todos os seus vícios dogmáticos e autoritarismo, e principalmente de disputa de poder entre o catolicismo e outras formas religiosas que despontavam espaço territorial e poder espiritual sobre o temporal, ou seja: o poder da Igreja sobre as decisões do Estado.  
             A relação de missão e colonização ganha instrumentos legais concedidos ao rei de Portugal como o direito de Padroado Régio a partir de 1442; um direito de conquista por serviços prestados a Santa Sé.
            Portugal tornara “senhor dos mares nunca dantes navegados, organizador da igreja em termos de conquista e redução, planificador da união entre missão e colonização”; tudo convalidado e autorizado pelas bulas papais (HOORNAERT, p. 34-35). 

c.    Raízes da formação doutrinária

            Uma nova ideologia foi se formando a partir das primeiras conquistas de Portugal em costas africanas, através dos resultados econômicos obtidos, pela concessão do padroado e pela legitimidade que as bulas papais proporcionavam. As bulas papais concedidas aos governos ibéricos davam plenos poderes para conquistar os povos (sarracenos e pagãos), comercializar, subtrair bens e terras, e até escravizá-los (muito embora, na época a captura e escravidão dos africanos foram profundamente contestadas na Europa). Concedia também o direito de comandar e organizar a Igreja na evangelização dos territórios conquistados. Este modelo de missão e colonização foi trazido por consequência ao Brasil e perdurou durante todo o período colonial e deu liga a formação do pensamento doutrinário no período imperial.
            Eduardo Hoornaert explica que “O elemento doutrinário é de suma importância na formação de uma cristandade, pois ele forma o embasamento da ação missionária e catequética”.  E ainda que “dois aspectos tiveram influência decisiva na maneira de pensar da cristandade: a matança e escravização dos indígenas brasileiros e a tráfico negreiro com a subsequente escravização dos africanos no Brasil”.
            Diante destas duas problemáticas, ninguém ficou alheio, pois uns legitimaram a ação portuguesa e daí decorreu um movimento doutrinário que atravessou toda a História do Brasil. Esta “legitimação se dará por palavras e discurso e o poderio português sobres os indígenas e negros; outros ficarão perplexos diante, hesitavam e ficavam inseguros” (HOORNAERT, p. 320,321).  
            Vale destacar que não faltaram nomes que se opuseram ao tráfico e ao sistema colonial. Somente para citar alguns, como Pe. Manoel da Nobrega, teólogos como Vitoria, o jesuíta Afonso de Sandoval, Luís de Molina (1536-1600), professor e teólogo em Évora entre 1568-1583 numa época crucial para a formação da teologia evangelizadora colonial e Antônio Vieira que atuou na região amazônica.
            Para Eduardo Hoornaert na formação do pensamento doutrinário é preciso levar em conta outro aspecto:

Só se pode estudar a doutrina da Igreja no Brasil dentro destes movimentos dialéticos que agitou os maiores espíritos que trabalharam na obra do evangelho aqui e que sofreram profundamente em sentir que estavam engajados, querendo ou não, nos percursos coloniais (HOORNAERT, p. 321).

O que o autor explica é que houve duas doutrinas na história da igreja no Brasil: uma profética, reveladora da face Deus no outro, seja ele indígena ou negro. Esta, na prática, conhecida como aldeamentos e proteção aos indígenas. E, dos negros pela prática de emancipação e alforrias. A outra doutrina justificava a expansão religiosa através da totalidade do projeto econômico colonizador, pois colonizar era evangelizar e reduzir a escravidão era catequizar. Esta escondia a face de Deus e enganadora. Este discurso servia aos colonizadores para se justificarem e esconderem-se da face de Deus enganando a si mesmo.  Mais uma vez os negros escravizados não foram participantes de um projeto no sentido profético.
            No período colonial a evangelização se voltou principalmente aos indígenas com o trabalho dos jesuítas num sistema que ficou conhecido como aldeamento. O aldeamento foi utilizado para facilitar o contato com os indígenas, afastá-los do convívio com os brancos e protegê-los da violência. Dentro do plano missionário Jesuíta, os indígenas tiveram grande importância. Infelizmente, o mesmo não ocorreu com relação aos negros escravizados, apesar deste terem grande importância no projeto colonizador. A evangelização ficou restrita dentro do quadro familiar patriarcal que escravizava. “Não houve missionário que compreendesse o valor libertador dos quilombos, por exemplo, [...]”. Simplesmente o que houve foi uma assistência aos escravos a pedido dos senhores ou de escravos convertidos ao catolicismo. Assim, “o escravo sempre foi visto como escravo” (HOORNAERT, p. 59).  
            Ney Santos escrevendo sobre Cristandade e teologia no Brasil colonial o pensamento teológico da cristandade lusitana como relação ao negro escravizado:
 
O jesuíta Jorge Benci, numa obra publicada em 1705 afirma que a escravidão e o cativeiro eram uma consequência do pecado original. As causas últimas da injustiça no mundo são atribuídas à fase anterior do Paraíso Terrestre. Alguns moralistas afirmavam que a escravidão não era apenas um castigo do pecado original, mas era um meio eficiente de conversão à fé cristã (SANTOS, p.05) [xxii].  

            Segundo Ney Santos a ‘teologia da cristandade’ foi a teologia lusitana católica imposta vigente no período colonial e imposta nos territórios brasileiro onde os portugueses conseguiram exercer irrestrita soberania, de modo pleno, estabeleceram instituições e normas de ocupação sem a oposição de outras sociedades ou ingerência de concorrentes.
            Os portugueses se colocavam como predestinados por Deus, escolhidos por Deus para serem portadores da salvação, assim o pregresso marítimo e econômico são vistos como manifestações da presença de Deus que legitimam não só as conquistas, mas qualificam-nos como designados por Deus em prol da edificação da cristandade. Assim fora do modelo lusitano católico não havia salvação e esperança para o homem. Além da concepção da Teologia do Desterro, que segundo Ney Santos, está representado principalmente na ‘oração de Salve Rainha’. Onde os “degradados filhos de Eva [...] gemendo e chorando neste vale de lágrimas [...] e depois deste desterro, mostrai-nos Jesus”. Ou seja, este mundo era visto como um ‘lugar de lágrimas e desterro e vale de lágrimas’ que favorecia o sistema colonial de opressor e ninguém deveria opor-se a isto, apenas aceitar como vontade de Deus.  
            Segundo Vasconcelos (p. 40), a evangelização do negro estava inteiramente ligada à Casa Grande e ao Regime Patriarcal (miniatura do modelo social vigente na Europa) e sua forma de vida social. A expressão de amor ao próximo e valorização da pessoa ficava, sob a responsabilidade dos senhores de engenho e dos feitores que escravizava. A religiosidade se centrava no modelo de catolicismo doméstico de adoração aos santos e rezas; sem questionamento doutrinário e confronto ao pecado. Era rara a presença de sacerdotes e párocos que apareciam em ocasiões especiais e ministravam os sacramentos.
            No período imperial a Igreja ainda se manteve unida ao Trono por força do Padroado Régio e da Constituição de 1824. E, até houve um esforço de Feijão para formação de uma Igreja Nacional, porém sem êxito.
            A partir do Segundo Império surgiram cabeças de resistência do prelado católico sobre a interferência do Estado nos assuntos da Igreja. Em parte, devido a preção do Pontífice de Roma o Papa Gregório XVI em sua encíclica Merari vos, datada de 1832 que em suma afirma que “compete ao pontífice romano governar a Igreja Universal”. O objetivo principal era centrar em Roma todas as decisões da Igreja Católica (SOARES, p. 21).
            Segundo Soares a partir da segunda metade do séc. XIX, grande parte do episcopado já havia sido influenciado pela mentalidade ultramontano que ia gerar na década de 70 o conflito que ficou conhecido como Questão Religiosa, já tratada neste texto. Apesar de todas as divergências, a Igreja se manteve fiel ao Trono até a Proclamação da República em 15 de novembro de 1889, acontecimento que pegou todos de surpresa, inclusive a própria Igreja Católica.

d.    A escravidão na Bíblia.

            Um estudo exegético se faz necessário para elucidar qual foram o pensamento bíblico original com relação à escravidão e os princípios que deveria nortear a teologia cristã com relação à escravidão. Este estudo bíblico deveria ser realizado na época dos conquistadores marítimos e praticado principalmente pelos católicos ibéricos. Todavia, vários fatores históricos, econômicos e religiosos contribuíram para que isso não ocorresse.  
            Para Anacleto Oliveira e Rogério Oliveira (p.151,152), a escravidão era um fenômeno social dos povos antigos, aparentemente tolerado por Deus dentro de determinadas condições regulamentadas pela Lei de Moisés (Levíticos 25). O estudo mostra que havia diferenças no tratamento entre a escravidão regulamentada no Pentateuco e a escravidão entre os gentios da Ásia Menor no primeiro século no Império Romano quando da divulgação do evangelho pelos apóstolos, na formação da Igreja, tratada nas cartas paulinas. Conforme a Lei (Levíticos 25:39), os judeus não poderiam ter escravos de sua raça, mas diaristas e ainda assim não seriam escravos perpétuos, pois havia um tempo de escravidão que prescrevia no Ano Sabático. Os escravos de fato só poderiam ser de origem estrangeiro. No Novo Testamento a escravidão aparece nos Evangelhos, embora na Palestina houvesse um numero bem reduzido de escravos. Todavia, tanto judeus como romanos possuíam escravos[xxiii]. Oliveira (p. 151) salienta a necessidade de compreender o pano de fundo sobre escravidão existente na Palestina nos dias de Jesus: “conhecer e compreender os dados do Novo Testamento sobre a escravatura significa conhecer a sua existência e a sua prática na Palestina dos primórdios da era cristã, determinar a atitude de Jesus e analisar as suas repercussões na doutrina e ação da Igreja primitiva” (Ibidem, p. 151). E continua noutra parte: “O próprio NT, nomeadamente os Evangelhos, faz-se eco da prática corrente da escravatura na Palestina” (Ibidem, p. 152). Interessante notar que o conceito neotestamentário de salvação como ‘resgatar’ e ‘remir’, adquiri mediante pagamento que são vistos em Cristo com relação ao perdido escravo do pecado tem como metáfora na linguagem da escravidão. Saber qual era a posição de Jesus sobre a escravidão pelas narrativas do evangelho é uma tarefa difícil. Pois não encontramos elementos suficientes para chegar a uma conclusão. Nas narrativas das parábolas são as únicas referencias de Jesus à escravidão e sem qualquer indicação imediata de aprovação ou condenação (Ibidem, p. 162). A passagem do evangelho do lava-pés durante a última ceia, o princípio do ensino cristão de ser servo para ser grande no Reino do Céu atinge o auge do paradoxo; quando Jesus se põe a lavar os pés dos discípulos considerado um serviço de escravos mais desprezados, os escravos judeus não eram obrigados a fazê-los. Este gesto chocante se verifica pela reação de Pedro, era para os discípulos um exemplo a seguir: “se eu lavei vossos pés sendo senhor e mestre; vós também deveis lavar os pés uns aos outros” (Ibidem, p. 163). Jesus introduz numa sociedade de senhores o princípio em que todos devem se tornar escravos para cura que o mal do pecado introduziu nos corações humanos e assim entrar no Reino de Deus.
            O estudo de Oliveira-Oliveira (p.165) também traz a situação social existente na igreja primitiva que são vistas nas cartas paulinas pelo grande numero de textos dedicados à unidade e igualdade entre todos, nas orientações quanto ao comportamento dos escravos e às orientações escravo-senhor e na doutrina escravidão-libertação. Onde fica bastante claro o princípio existente na igreja primitiva; o princípio de unidade e igualdade: “Não há judeu, nem grego; não há escravo nem livre, não ha homem nem mulher, pois, todos vós sois um só em Cristo”. “Que é um em todos”.[xxiv] “a partir daí o que conta é a condição idêntica em todos os membros da igreja, na qual todos formam o corpo de Cristo”. No entanto, o apóstolo Paulo condicionou que todos deveriam permanecer na condição social em que foram chamados: “se escravos, escravo; se livre, livre”; e, em sua posição social deveriam dar provas da fé que possuíam e testemunho de Cristão. Na Igreja, as diferenças sociais deveriam ser suplantadas pelo amor ao próximo, pela unidade e igualdade e na sociedade deveriam ser superadas pelo testemunho cristão (Ibidem, 165-170). Na igreja primitiva não houve de fato uma ideia de abolição da escravatura nos moldes do séc. XIX, mas se esperava uma mudança da sociedade que se daria através dos princípios que se viam nos evangelhos, que se traduzia numa transformação interior do ser: “Se o Novo Testamento não é revolucionário, é menos ainda conservador: de fato, toda a ordem social é descartada, e não com a força deste mundo” (Ibidem, 171).
            Segundo Oliveira – Oliveira (p. 180) a perseguição e o martírio foi a causa para uma estreita comunhão entre os cristãos independentemente de suas condições de homens livres ou escravos. “A participação no mesmo sofrimento, na mesma esperança e no mesmo ideal de não renegar a sua fé e de dar encorajamento testemunho de Cristo, unia os cristão, quer fossem escravos ou livres”. Muitos foram os escravos que corajosamente testemunharam sua fé em Cristo nas Arenas romanas, sozinhos, contrariando a vontade de seus senhores ou juntamente com eles num pacto de fé. Devido a sua coragem e lealdade à fé cristã suas sepulturas ficavam lado a lado aos dos homens livres e as inscriçoes funerárias esqueciam as diferenças sociais da vida terrena (Ibidem, p.181). Nao se pode negar que a Igreja primitiva ‘nunca’ renunciou aos serviços escravos. Qualquer senhor convertido e batizado poderia ter escravos cristão, mas nas seguintes condições que o tratassem como irmãos e filhos e igualmente recomenta aos escravos cristãos a amarem seu senhor e no caso de ser cristão, tratá-los como irmãos e serví-los dedicadamente. Oliveira - Oliveira (p.182) informa que S. João Crisóstomo descreve do seguinte modo as relaçoes que deveriam existir entre senhor e escravo cristão:

Que haja reciprocidade de serviço e de subordinação; desse modo jã não haverá escravidão, Se senhores e escravos se servirem mutuamente; então é melhor serem escravos nessa condiçao do que senhor em condiçoes opostas, em que as relaçoes entre um e outro são marcadas pelo despotismo e pelo servilismo (OLIVEIRA-OLIVEIRA, p.182)[xxv].

Na situação em que os senhores eram pagãos, a recomendação para o escravo cristão era que se submetessem aos seus senhores e que tratassem bem, para que este não blasfemasse contra a Religião e se indispusessem contra o cristianismo. Deveriam aceitar livremente a condição social e se tornarem apóstolos de Cristo junto aos seus senhores, assim como Cristo aceitou livremente a missão para resgatar os pecadores perdidos se submetendo ao Pai na condição de servo. Este apelo ‘não deveria ser entendido como forma de ligitimar e sublinhar a existência da escravatura para que esta pudesse se perpetuar’. Esta posição da Igreja primitiva, inclusive na visão de João Crisóstomo, atendia duas condições: 1. ‘Dignificar o escravo’ em sua condição social numa comparação com Cristo que se fez servo de todos e para que ninguém desprezasse os escravos em sua posiçao social; 2. ‘Investir os escravos de uma missão a cumprir livremente, como cristão e enviado de Cristo junto à sua família e ao seu senhor’.  “Esta missão era livremente aceita e não uma imposiçao servil” (Ibidem, p. 183).
            O resultado prático segundo Olivieira - Oliveira (p.184) da aplicação dos princípios do evangelho na vida socia daquele tempo foi “manumissão, favorecida e tornada possível pelas novas condições sôcio-econômicas” que era vista “não só como uma obra humanitária, mas como uma obra de caridade agradável a Deus e como o melhor modo de alcançar misericórdia, a remissão dos pecados e a salvaçao da alma”. Ou seja, dar liberdade aos cativos era vista como uma forma de alcançar a salvaçao. Oliveira-Oliveira continua informando que nas “As atas dos Martires” há o relato de Hermes, que no tempo de Trajano, libertou 1250 escravos, num domingo de Páscoa. Cromácio, antigo prefeito de Roma, libertou 1400 deles; Santa Melania libertou oito mil num só dia[xxvi]. Havia casos em que pela morte de um parente ou amigo se oferecia a Deus a libertação de um ou mais escravos.
            A igreja primitiva nao pensava em uma emancipação dos escravos de forma ampla; o que se pensava era a extinção pela formação vivida em toda a esfera da sociedade, primeiramente nas assembleias cristãs, na vida familiar de seus membros e na politica. “Possuído daquela força de penetração que é próprio da religião tendia a penetrar na consciência individual e social e a tornar norma inspiradora de toda a vida” (Ibidem, p.195).
            A conclusão que Anacleto Oliveira e Rogério Oliveira (p.196) chegam de seu estudo sobre “Cristianismo e a escravidão” (que aqui faço um resumo), é que seria muito natural e lógico que as “concepções do cristianismo sobre a instituição do Império seria muito fácil prever para breve o fim da escravidão.” Tendo em vista “os princípios cristãos de igualdade fundamental entre todos os homens” e o “domínio cada vez maior da Igreja sobre as realidades temporais, mas isto só na teoria, pois na prática foi muito mais complexa. A escravidão continuou a existir mesmo em regiões onde a Igreja demonstrava sua poderosa influência”. 
            Anacleto Oliveira e Rogério Oliveira enumera duas possíveis razões do fracasso da Igreja em extinguir com a escravidão:
1)         A partir do século IV, o cristianismo foi marcado por um espiritualismo que desmobilizou do seu empenho de transformar a sociedade. As dificuldades econômicas e sociais vividas pelos cristãos levaram a pensar numa salvação espiritual transcendental e eterna separada da libertação e salvação deste mundo. A visão dualista que “desvalorizava a vida terrena e favor de uma vida ulterior e super-uranica e de nítida influência platônica”. “De fato o neo-platonismo dominou os meios cristãos”. A teologia vertida por Santo Agostinho e exposta na obra ‘A cidade de Deus’ – que iria dominar o pensamento medieval.  
2)        A acomodação da Igreja frente à constantinização a partir do IV século devido aos privilégios concedidos pelo Estado; fez com que a Igreja perdesse a força de provocar impacto e poder de transformação na sociedade de acordo com os ensinamentos recebidos de Cristo e dos Apóstolos. “Quando a Igreja se tornou proprietária, possuindo também ela escravos em grande número, nessa altura sua capacidade de intervensão ficou extremamente reduzida” (OLIVEIRA-OLIVEIRA, p.196).

          A citação de M. Bloc por Olivieira-Oliveira (p. 197) onde nos cânones conciliares os bispos da Igreja proibiam os padres de libertarem seus escravos das propriedades eclesiásticas e dos abades de emanciparem os escravos dados aos seus mosteiros remete ao Direito Romano de propriedade, pois para o clero “os bens da Igreja era em princípios inalienáveis e os seus administradores não deveriam dispor deles segundo razões de piedade”.[xxvii] Oliveira- Oliviera finaliza dizendo que estes cânones descrevem uma mudança na mentalidade das lideranças cristãs; “é evidente um compromisso da caridade cristã com as ordens estabelecidas a partir da paz de Constantino e do consequênte enquadramento da Igreja nas estruturas imperiais”. 
            Segundo Oliveira-Oliveira (p. 198) não pode deixar negar que a atuação do cristianismo na escravatura antiga: “esta praticamente despareceu. Os escravos tornaram-se servos. Ainda que formassem uma classe social inferior, dependente, explorada e desprezada; eram considerados como pessoas, e como tais, pertencia à sociedade que serviam”. A escravidão nunca deixou de existir na Idade Média e estava presente entre todos os povos cristãos ou pagãos, católicos, judeus e muçulmanos. As invasões bárbaras fez perpetuar o tráfico de escravos e a escravidão nesse período, pois os derrotados nas guerras eram feitos escravos ou levados cativos para serem comercializados tanto adultos como criança de ambos os sexos. A lei que basicamente regulamentavam e legitimavam a escravidão foi o Direito Romano[xxviii], depois surgiram outras leis como o Direito Germânico e na Igreja Católica o Código do Direito Canônico.
            Altamente lucrativa o tráfico e comércio de escravo perdurou por toda a era medieval. Havia rotas comerciais de escravos que cortava o continente europeu e africano trazendo escravos de diversos pontos do mundo; Eslavos, muçulmanos, celtas e cristãos. Apesar do esforço e proibições dos papas em impedir que cristãos se tornassem escravos; a prática nunca se extinguiu nesse período.[xxix] Italianos de Veneza, Judeus, muçulmanos e ibéricos (mouros), Vikings, mongóis e britânicos, todos praticavam trafico de escravos. O comércio de escravos na Inglaterra foi oficialmente abolido em 1102 por força e decisão do bispo de Cantuária[xxx]. No Concílio de Westminster, o clero britânico condenava a escravidão contrária aos ensinamentos de Cristo e declarava: “Let no one hereafter presume to engage in that nefarious trade in which hitherto in England men were usually sold like brute animals.” [xxxi] Outros países seguiram o exemplo, na Polônia a escravidão foi proibida no sec. XV. Na Lituania, em 1588 a escravidão foi abolida.
            À parte, a escravidão praticada pelos países católicos e protestantes a partir do sec. XV não encontram fundamentação bíblica favorável. Também, ao considerar o contexto histórico-social e a problemática existente no Brasil envolvendo Estado, Igreja e escravocratas que disputavam poder, e de outro lado, os abolicionistas liberais, sociedade livre favorável à emancipação e os negros que se esforçavam pela libertação. Também, não encontramos nestes grupos ou em particular uma ‘voz profética e discursiva’ que tangenciasse os pensamentos a fim de formar opinião teológica favorável à abolição. Os discursos favoráveis à abolição vinham de representantes políticos, de integrantes de movimentos abolicionistas, advogados, escritores e jornalistas que usavam o palanque, a tribuna e a imprensa para atacar a escravidão. Portanto, as vozes estavam e vinham de fora do clero e tinha conteúdo politico e social, ético-moral e com objetivos filantrópicos.

e.    O desvio de propósito da Igreja.

            Como vimos até aqui, o catolicismo brasileiro sempre esteve ligado ao Estado pelo sistema de Padroado e em constantes tensões, devido a conflitos de interesse, de autonomia e poder. A Igreja Católica pretendia a romanização nos termos do Concílio de Trento da qual lhe daria maior autonomia nos assuntos eclesiásticos. Todavia, o lugar ao lado do trono lhe parecia confortável, lhe dava prestígio e a mantinha no poder diante da eminente presença do protestantismo. Para a Igreja Católica qualquer oposição aos interesses do Estado se constituía subversão, assim os ideais republicanos (isso incluía a abolição do elemento servil), estava fora de seus planos. A Igreja permaneceu fiel ao lado do trono até o último instante de sua destituição por ocasião da Proclamação da República. Estado e Igreja são destronados pela República. A Igreja perdeu a parceria da Corte e o privilégio como única religião no país.  Isso nos faz ver que a Igreja foi mais fiel ao seu ‘senhor’ secular do que propriamente aos princípios constituídos nos Evangelhos. Princípios estes, que estão nos ensinamentos de Jesus Cristo. 
            Desta forma, devemos fazer uma análise da relação Igreja-instituição e Estado, visto que nesta relação de político-religiosa há conflitos de interesses e são formadores de discurso e de intensões teológicas. A fé religiosa estabelece seus tentáculos com a finalidade de perpetuar seus domínios sobre o governo e na mentalidade da população:

O objetivo da qualquer instituição religiosa é propagar sua mensagem religiosa. Dependendo da percepção que tenha dessa mensagem, pode vir a se preocupar com a defesa de interesse, tais com sua unidade, posição; em relação às outras religiões, influência na sociedade e no Estado, o número de seus adeptos e sua situação financeira (MAINWARING, p.16).

Segundo Scott Mainwaring (p.16), toda instituição tem a preocupação de se expandir e por isso ‘pode usar métodos que são inconsistentes com os objetivos da mensagem inicial’. Seu objetivo principal é oferecer o caminho da salvação, mas para que isso ocorra, precisa se equipar para a missão: vencer a concorrência e se manter no poder. A preocupação pode adquirir uma dinâmica própria e ajuda a determinar as ações da Igreja. Ao competir com outras religiões (ou com os interesses em conflitos), pode se empenhar em práticas inconsistentes quanto ao seu próprio credo. “Assim a proteção de seus interesses pode entrar em conflito com a mensagem inicial”:

A cristandade argumenta, H. Richard Niebuhr, frequentemente alcança aparente sucesso ao ignorar os preceitos de seu Fundador. A Igreja quanto organização interessada na autopreservação e no ganho de poder, por vezes considera os conselhos da Cruz um tanto inconvenientes, como o fazem grupos econômicos e nacionais. Ao lidar com grandes males sociais, tais como guerras, a escravidão e a desigualdade social, a Igreja descobre ambiguidades convenientes no Evangelho e isto lhe permite violar o espirito da Bíblia e aliar-se ao prestígio e ao poder (Ibidem, p. 16).

Scott Mainwaring salienta ainda que a tendência de proteger os interesses da instituição não significa a ausência de uma fé sincera e que também a pura fé só ocorra fora das Igrejas institucionais. No entanto, para algumas instituições, a defesa de interesse é essencial para a promoção da fé, pois, “dentro desta ótica, já que a salvação só pode ocorrer através da instituição, a Igreja entende que precisa desses recursos para desenvolver a sua missão com eficácia[xxxii]: A tendência de proteger os interesses organizacionais tem sido e continua sendo, dessa forma, um elemento chave do envolvimento da Igreja Católica na política” (Ibidem, p.16).
            Para Mainwaring (p.18), a Igreja possui uma hierarquia de objetivos que abrange desde os objetivos máximos (salvar e transmitir sua mensagem) até a preocupação instrumental, tais como expansão da instituição, posição financeira sólida, posição sobre o Estado e elite.  Estes são objetivos instrumentais que a igreja não necessariamente tem que adotar para cumprir a sua missão religiosa. Assim, conclui: “a forma pela qual a Igreja intervém na política depende fundamentalmente da maneira pela qual se percebe sua missão religiosa” (Ibidem, p.21).  Dessa forma, segundo o autor, se constrói uma auto identidade com a sua missão que se expressam por meio de discurso e práticas. Noutra parte, Scott Mainwaring (p.24) continua: “Quando o fim fundamental da instituição for suprarracional, ela disporá a sacrificar alguns interesses, caso esteja convencida de que fora chamada para fazê-lo”. E afirma ainda que a Igreja-instituição poderá abrir mão dos objetivos instrumentais “se sentir que sua missão religiosa a obriga a agir dessa maneira”.
            Foi o que aconteceu com a Igreja Católica no séc. XX, quando passou a se preocupar com a sua real missão, se voltando para a população mais pobre, a Igreja se transformou. Na medida em que mais se preocupava com a sua missão; e as mudança politicas e sociais ocorriam, afetavam o seu ideário e novas reflexões internas se faziam necessária para renovar sua missão dentro do novo quadro que se formava. Logo, sua identidade se modificou não por causa dos interesses da instituição, mas por causa das suas convicções de fé e missão que se formaram dentro das mudanças sociais e políticas que se apresentava (Ibidem, p.25).
“Precisamos compreender a auto identificação da instituição; como se expressa através de seu discurso e de suas práticas. Assim como as mudanças sociais que possam alterar essa identidade (Ibidem, p.26)”.
            Este estudo começou com a Igreja Católica do séc. XV permitindo e legitimando seus súditos a conquistar, capturar, prender, escravizar e a matar em nome da Igreja com a promessa de salvação eterna em consórcio com os poderes temporais dos reis. Esta legitimação foi concedida através das bulas papais daquele século. Na prática, sua teologia era opressora, destituída de amor ao próximo, preconceituosa, sectária, arrogante e materialista. Expressa mais as forças do inimigo do que a vontade de Deus. Esta mesma instituição no final do séc. XIX, está promovendo a vida, incentivando seus súditos a dar libertação aos cativos, amar o oprimido como irmão e membro da família sob a promessa de perdão de pecados e salvação eterna. Em parceria com a sociedade, o bispo promove movimentos, lidera reuniões, arrecada fundo, libertam seus cativos, idealiza leis de proteção e libertação. Tudo em nome da caridade (amor) e sob a promessa de salvação. Sua leitura do Evangelho é tangenciada pelos dogmas católicos que não permite afirmar claramente que precisa obedecer aos mandamentos do Senhor Jesus se quisesse ter parte com Ele e salvação da alma.
O papa merecia uma prenda pelo seu Jubileu, mas muito mais o negro deveria ser libertado pelo simples fato dele ser irmão. A cor da pele não define destino eterno e nem caracteriza classe social. A cor somente me ensina a amar e conviver com o diferente. São como as cores do arco-íris onde os diferentes estão lado a lado numa beleza sem igual e admirável. O pardo, o branco, o amarelo, o negro, o mulato, o moreno, o albino, o indígena são as cores da beleza humana abençoada por Deus.
             

f.     Acontecimentos dos últimos dias

            A participação da igreja nos últimos dias do processo final de emancipação do elemento servil, não fica bem claro na história do Brasil. O que sabemos, é que a participação da igreja nos últimos anos aconteceu de forma apática, pois este é o lamento de Joaquim Nabuco em campanha na Província de São Paulo pela abolição, que destaco:

(...) que efeito prodigioso não faria a palavra do sacerdote que realmente pregasse a moral social do evangelho! Mas onde já se viu um missionário abolicionista! (...) ainda não houve no Brasil um bispo que levantassem a voz contra a escravidão, como os houve para levantar a voz contra a maçonaria, apesar de estar a escravidão mais condenadas por bulas pontificiais – e por concílios – do que a maçonaria (HAUCK, p. 279).

Sabe-se que a Lei Áurea foi aprovada em tempo recorde. A Assembleia dos Deputados recebeu o texto do Ministro Rodrigo Silva na terça, dia 8 de maio, passou pelo Senado no domingo dia 13 e foi aprovada e no mesmo dia. Coube a Princesa Isabel sancionar a Lei por volta das 14 horas. O Papa Leão XIII era favorável à emancipação dos escravos, pois já tinha se manifestado a respeito ao enviado especial a Roma. O Ministro João Artur de Souza Correia, por ocasião de sua audiência com o papa no seu Jubileu 14 de Janeiro de 1888 disse: “(...) desejamos dar ao Brasil um testemunho todo particular de nossa paternal afeição a respeito da emancipação dos escravos”. Dirigindo-se à princesa: “A princesa imperial regente cumpre uma grande e nobre tarefa (...): mas ela pode contar com a nossa solicitude que nunca lhe faltará” (RAUCK, p. 284) [xxxiii]. Em 10 de fevereiro de 1888 o Pontífice recebe o abolicionista Joaquim Nabuco que insistia numa palavra do papa: “A palavra da V. S. exerceria maior influência no ânimo do governo e na pequena parte do país que não quer acompanhar o movimento nacional. Esperamo-nos que V.S. dirija uma palavra que prenda a consciência de todos os verdadeiros católicos” (RAUCK, p.285) [xxxiv]. Devido a reações do governo conservador do Gabinete de Cotegipe e ações diplomáticas, a encíclica do papa foi atrasada e somente em 05 de maio foi redigida e o Brasil tomou conhecimento quando já não havia mais escravos. O papa presenteou a princesa com a pena de ouro e felicitou-a pelo feito.  
  
CAPÍTULO QUATRO 

13. O DISCURSO E A TEOLOGIA 

             4.1. Conceito de Analise[xxxv] do discurso em Foucault, Bakhtin e Pêcheux. 

            A discussão da Igreja católica com relação à escravidão desde seus primórdios, na colonização com os Pe. Manoel da Nobrega e Antônio Vieira e outros; os discursos de diversos clérigos no período imperial, os seus sentimentos e dúvidas até finalmente chegarmos à teologia com relação à escravidão dentro do contexto histórico existente no final do século XIX, teve uma construção histórica típica e exclusiva que só ocorreu no Brasil. Tendo em vista o que se formou até a segunda metade do séc. XIX foi um catolicismo brasileiro com características próprias. A consciência e seu ajuizamento em torno do tema escravidão e abolição é construída ao longo de mais de três séculos de dominação católica em território brasileiro. Com o fim da escravidão e a Proclamação da República, a corrida para a destruição de arquivos que não mais interessavam ou que viessem comprometer os senhores e a Igreja, foi destruída. Desta forma, muitos documentos que poderiam ser verdadeiros monumentos históricos foram perdidos dificultando respostas esclarecedoras.
            A historicidade são condições necessárias para que a Analise do Discurso (AD) com a fundamentação teórica em Foucault, Bakhtin e Pêcheux que levam em conta documentações, registros, textos, etc. Estes documentos se tornam “monumentos” que vão caracterizar,  identificar, constituir a instituição ou o indivíduo; e assim, oferecer leitura e, por conseguinte, hermenêutica do discurso da instituição no período histórico que se propôs fazer a analise.
Na leitura direta dos documentos – textos sejam cartas pastorais, jornais da época, documentos judiciais, etc., ou a leitura indireta das práxis da instituição, estão o conteúdo discursivo e, por conseguinte suas intenções e mentalidade a respeito de determinado tema, neste caso a escravidão e abolição.
            No contexto histórico próprio que se formou no catolicismo romano e no sistema feudal europeu que os lusitanos tardiamente permitiram ser renovados e a formação da classe mercantilista que advém da corrida marítima, vão sedimentando a ideia que embasou a legitimidade da escravidão. Aliado ao sistema católico vigente e atuante, inclusive ao poder concedido pelo papa através das bulas do séc. XV e XVI a teologia católica escravista ganhou forma e discurso.  No conceito de Foucault “estes” ou “os registros históricos são colocados num perspectiva de forma a identificar a instituição ou individuo” e segundo Sara Azevedo, historia que Foucault “fez é na intensão de dar condições de possibilidade de conhecimento” (AZEVEDO, p. 14). Logo, esta historicidade me faz “ler” não mais as intenções, mas o “comportamento”, resultado da leitura teológica que a instituição católica fez naquele tempo sobre a escravidão e se traduziu em ações evangelísticas missionárias conforme o modelo aqui estudado.    Basicamente o discurso é algo que vai além do texto e enunciado é todo conjunto de forma de comunicação. Sendo que o mais importante não é o conteúdo discursivo, mas o que ele comunica, pois, o discurso dominante tem o poder do que é aceito ou não em uma sociedade (AZEVEDO, pp.155-157). Tem aplicabilidade e se justifica dentro da historicidade do catolicismo romano em suas relações com a escravidão no Brasil.
A análise dos discursos orais e textuais, teológicos e filosóficos existentes e citados nas bibliografias apresentadas aqui oferece uma leitura teológica do discurso e estão presentes nas cartas pastorais produzidos pelo episcopado e nas ações isoladas de indivíduos do clero nos últimos anos que antecederam a abolição. Apesar da aparente apatia no compromisso social com o negro, a Igreja produziu material suficiente para saber sua teologia discursiva.
 A comparação destes modestos ideários Católicos com o fervor discursivo dos movimentos abolicionistas são inevitáveis e necessárias para traçar uma linha divisória entre o que é discurso social e político do que é discurso eclesiástico teológico. Os discursos abolicionistas, ainda que tivessem princípios teológicos, eram sociais e filantrópicos e quase sempre político. É até possível crer, mas sem base teórica, que a bandeira do abolicionismo por muitos foi levantada apenas para derrubar o velho sistema monárquico; estes eram indivíduos da política de esquerda, que também pretendia chegar ao poder. Seus discursos estavam repletos de interesses políticos e econômicos, ainda que promovessem o bem-estar social e melhoria de vida do negro e precisavam ser analisados dentro do contexto histórico que se propôs. Diferentemente do discurso eclesiástico onde conforme informa Azevedo (2013), falando de Michel Foucault o discurso que: “oferece um saber como construção histórica, e como tal, produz verdade que se instala e se revela na prática discursiva”. Assim, a práxis católica se revelou no discurso. Numa sequência por mim construída a partir do meu entendimento que fiz sobre AD: Historia. > Discurso > Práxis > conhecimento.  

a.    A teologia no discurso da carta de D. Lacerda bispo do RJ.

A teologia para Batista Libânio e Afonso Murad (1996) é “uma sequência de movimentos que termina em Deus, mas trata antes de tudo de operação intelectual humana; que se configura determinado tipo de saber, de conhecimento. Num esforço de compreensão que a inteligência humana empreende”. Destarte, a teologia como atividade humana com relação à escravidão, cuja investigação recai na aplicabilidade de conceitos teológicos que a Igreja Católica compreendia naquele momento histórico, mas que foi construída no decorrer dos séculos. Essa “operação intelectual que configura determinado saber e conhecimento num esforço de compreensão que a inteligência humana empreende” são as interpretações pessoais e institucionais com respeito aquilo que as Escrituras afirma sobre escravidão, por exemplo.
            Tomando como exemplo a carta de D. Pedro Maria de Lacerda, bispo do Rio de Janeiro, amigo da família real, sobre a Lei do Ventre Livre de 28 de setembro de 1871 onde, segundo Hauck (p.277) o bispo invoca o feito como um ato de profunda gratidão e generosidade de seus promulgadores, e o texto da carta expressa o pensamento de um alto clero da corte.
Nessa carta, o bispo D. Lacerda não reconhece o direito natural do negro pela liberdade como fez o Papa Leão XIII na sua bula: “É coisa salutar restituir pelo beneficio da alforria, à liberdade em que nasceram os homens que a natureza fizera livres desde o início”. ‘D. Lacerda não contesta a legitimidade da escravidão nem afirma o direito natural do escravo à liberdade’. O texto da carta de D. Lacerda aponta para o conservadorismo e perpetuação da escravidão. Por outro lado, este “conservadorismo” aponta para uma conformidade com a recomendação do Apóstolo Paulo dirigida a Igreja de Éfeso quando fez a seguinte orientação:

Escravos obedeçam aos seus senhores terrenos com respeito e temor, com sinceridade de coração, como a Cristo. Obedeçam-lhes não apenas para agradá-los quando eles os observam, mas como escravos de Cristo, fazendo de coração a vontade de Deus. Sirvam aos seus senhores de boa vontade, como servindo ao Senhor, e não aos homens, porque vocês sabem que o senhor recompensa cada um pelo bem que pratica, seja escravo, seja livre (NVI- Efésios 6:5-08).[xxxvi]

Verificamos por este texto que os escravos na Igreja primitiva foram ‘doutrinados’ a serem obedientes aos seus senhores e os senhores a amarem seus escravos como irmão. Como já foi afirmado na introdução deste texto, para Bakhtin “Nosso próprio pensamento (...) nasce e forma-se em interação e em luta com o pensamento alheio, o que não pode deixar de refletir nas formas de expressão verbal do nosso pensamento” (FILHO, TORCA, p.3).[xxxvii] Dessa forma, ao repetir as palavras do Apóstolo Paulo em sua carta o bispo D. Lacerda faz uma contextualização de seu tempo com a das Escrituras ignorando o tempo e a ‘Iluminação’ concedido ao intelecto humano com relação ao próximo.
           

b.     Teologia no discurso de D. João Antônio Santos.

            A carta pastoral do bispo de Diamantina, D. João Antônio Santos, de 31 de dezembro, convocando a população para um ato de justiça, a saber: oferecer uma ‘prenda’ ao papa por ocasião de seu Jubileu, mais o sermão do padre Sypolis publicado no jornal Jequitinhonha se torna ‘monumentos’ pelos quais vamos ler a teologia que se formou na mentalidade eclesiástica e se revelou nas ações práticas no episcopado de Diamantina, quando ela fez a leitura da necessidade local e aplicou o evangelho e se efetuou na região em beneficio dos escravos e da sociedade em geral. Além disso, vamos considerar as ações praticas do governo de D. João A. Santos a frente da diocese de Diamantina. No conceito de AD a ação prática revela o discurso da instituição ou do indivíduo.
            Conforme informa Lívia Oliveira (p. 83), o bispo D. João A. Santos “escreveu nesses jornais o quanto a escravidão representava a injustiça e a opressão para com o próximo e que por isso teria sido criticado por cometer um ato de imprudência” e convoca a todos para um ato de caridade e amor ao próximo, libertando o escravo como presente ao papa pelo seu Jubileu. E ainda que o governo devesse aproveitar a data para resolver o problema servil.  E “os cativos eram irmãos e vitimas dos interesses particulares e das rendas do Estado” (OLIVEIRA, p. 96). 
            Considerando tais palavras e uma vida de dedicação ao episcopado de Diamantina, verificamos que a leitura que D. João fez da vida que viveu, integrou as necessidades de todos os níveis sociais de sua região. Não deixou de lado nenhum grupo social e seus interesses. Já vimos neste estudo, como D. João A. Santos na região de Diamantina promoveu o desenvolvimento unindo interesse da religião e da sociedade. E como os mais prejudicados foram alvos de sua ação social, o elemento servil, os fazendeiros, agricultores, comerciantes e religiosos se associaram num objetivo comum sob a liderança do bispo. A leitura que o bispo fez de seu ministério junto ao seu rebanho incorpora um tipo de ‘Evangelho Social’ que incorporasse religiosidade católica e compromissos sociais econômicos, onde há a necessidade de reconhecer a liberdade imediata dos cativos. Não se vê na fala do bispo que se deva perpetuar a escravidão: “o governo deveria aproveitar a data e resolver o problema servil”. Enquanto isso não acontecia, apelou para a caridade das pessoas, visto que em outra fala o bispo lembra que a liberdade não virá do governo. Segundo, a integração bispado e economia local onde a Igreja participa das reuniões de associações de desenvolvimento da região uma clara demonstração que a Igreja não apenas se preocupava com o religioso, mas com o bem-estar material. A saúde financeira, religiosa e extinção da escravidão parecem ser os objetivos.  Mais uma vez isso reflete o Evangelho Social (não me refiro ao Evangelho Social de Walter Rauschenbusch). Jesus não somente se preocupou com o futuro eterno de seus discípulos, mas com a saúde física, e até financeira. Quando conseguiu dinheiro para Pedro pagar o seu imposto e o Dele (NVI-Mateus 17:27). A teologia de D. João A. Santos presente nos seus discursos seja ele por escrito ou pela prática de sua ação é sua ambição, era mais ampla que os interesses do catolicismo.
         

c.     Teologia no sermão do padre Sypolis no artigo do jornal Jequitinhonha.

           No discurso do padre Sypolis da Diocese de Diamantina, encontramos semelhança com a carta de D. Lacerda e do papa Leão XIII. Com a carta de Lacerda porque apela para a “bondade dos senhores e humildade dos escravos” (Efésios 6.5-9); com a bula de Leão XIII porque o papa descreve o quanto o cristianismo contribuiu para a extinção da escravidão. A carta de Filemom reflete a relação prática de tolerância e humildade entre senhor e escravo. O fugitivo voltando para casa do seu senhor e sendo por ele recebido com dignidade, pois agora era parte da família cristã. Na fala do padre Sypolis notamos que o clero envolvido na defesa do menos favorecido e prestando seu serviço pastoral aos fiéis. Esta Igreja que não se preocupava somente com a religiosidade, mas com os assuntos gerais da sociedade e através do Bispo D. João A. Santos, estava presente nas reuniões de associações, tinha um discurso de mediação entre Senhores e escravos. Isto se verifica pelo texto utilizado pelo padre Sypolis da carta de Filemon, pois as fugas e revoltas pareciam ser o problema naquele momento. O que concorda com a informação de Oliveira (p.32) que o Jornal Jequitinhonha condenava as fugas e revoltas. O Pe. Sypolis também ressalta o papel da Igreja no decorrer da história no combate a escravidão e libertação dos escravos.
Na prática o cristianismo contribuiu para quase total extinção da escravidão. E coube à princesa Isabel, católica, o golpe fatal no ocidente.    
Em resumo: necessidade local > leitura da necessidade pela Igreja > formação da mentalidade + teologia pratica + discurso > ações/práxis da Igreja > resultado positivo/negativo > ‘monumento’/Analise do leitor.

d.    Teologia na Encíclica papal de Leão XIII de 05 de maio de 1888.

Consideremos agora a bula papal de Leão XIII[xxxviii] e para isso separamos um periscópio da mesma para analisarmos sua teologia e pensamento. Vejamos por exemplo esta parte:

Somos, em verdade, o Vigário de Cristo, Filho de Deus, que a tal extremo amou o gênero humano, que não só não se dignou fazendo-se Homem, habitar entre nós senão que também, comprazendo-se em chamar-se Filho do homem, claramente protestou que se abatera à nossa condição a fim de anunciar aos cativos a sua libertação (Is. LVI, I, Luc. IV. 19) a fim de que, quebrasse as algemas da escravidão que oprimia o gênero humano, isto é, as algemas do pecado, restaurassem todas as coisas nos céus e na terra (Ef. 1,10) deste modo restabelecesse na pristina dignidade toda a descendência de Adão contaminada pelo pecado original (INTERNET).[xxxix]

Na parte do discurso textual relacionada à escravidão o que vemos de teologia? O texto de Leão XIII comunica a relação de Cristo e a libertação por ele proporcionada e está perfeitamente de acordo com os evangelhos com uma leve passada pela carta paulina de Efésios e faz visível analogia com a libertação dos escravos. Assim como os negros está preso pelos grilhões da escravidão (maldade humana, cobiça, materialismo fruto do pecado) o homem estava preso pelo pecado e Cristo libertou o homem dos grilhões do pecado, da natureza herdada de Adão.
A escravidão é fruto do pecado no coração do homem que Cristo libertou, desta forma se Cristo libertou o homem; também libertou o homem do pecado da escravidão. Por isso, o homem não necessita mais carregar esse pecado em si. Parece que para Leão XIII que a extinção da escravidão começa com a libertação do pecado em si mesmo, portanto, a escravidão é fruto do pecado humano, e deste pecado, Cristo nos libertou. A escravidão foi uma dessas maldades imposta ao homem caído; veja como Leão XIII considera a escravidão:

De onde se conclui que o estado de escravidão de direito foi imposto ao homem pecador, e por isso é que nas Escrituras não encontramos a palavra escravos antes que o justo Noé vindicasse com tal palavra o pecado do filho. E, pois, proveniente este nome, não da natureza, mas do pecado (Gn. 1.25, Noé c/ XXX). Do contágio do primeiro pecado se derivam todos os males, e, sobretudo, essa perversidade monstruosa, em virtude da qual homem houve que, esquecidos da fraternidade original e desprezando os ditames da razão natural, não só não observam entre si o mútuo amor e a mútua benevolência, senão que arrastado pela ambição, começaram a ter os outros na conta de inferiores a si, e por isso a tratá-los como animais nascidos para o jugo. Dessa forma, não tendo em consideração alguma à identidade da natureza humana, a dignidade humana, a imagem divina impressa no homem, sucedeu que, graças às questões e guerras que ao depois estalaram, os vencedores escravizassem os vendidos, e a multidão, ainda que da mesma raça, se dividisse gradualmente em indivíduos de duas categorias distintas, a saber: os escravos vencidos sujeitos ao domínio dos vendedores seu senhores (INTERNET).[xl]

Percebe-se nesta bula de Leão XIII sua indignidade quanto à instituição escravidão e é possível saber como ele entendia a origem da escravidão, ou seja, ela tem origem no pecado, na Queda do homem e não na natureza formada em Genesis antes da Queda (Gn. 1.25). É muito pertinente a observação do papa, passagem de Noé que repreende seu filho Cão quando o vê nu após a embriagues com vinho e lança maldição em sua descendência: Disse: “Maldito seja Canaã”! Escravo de escravos será para os seus irmãos" (Gn. 9:25 NVI). Ou seja, a palavra escravidão para o papa Leão XIII, surge novo mundo quando acontece o primeiro pecado.  Todavia, se Noé tinha em mente escravidão é porque antes do dilúvio a escravidão já existia. O que fez Noé foi perpetuar algo que Deus condenou pelo dilúvio. A continuidade da escravidão para Leão XIII tem origens nas guerras e cobiças humanas que desvalorizou a raça negra estabelecendo duas classes de vencidos e vencedores. 
            Concluímos que para Leão XIII o homem foi libertado do pecado por Cristo e a escravidão repugnante é fruto do pecado original, da Queda de Adão, se permanece no mundo, porque é alimentado pelo egoísmo, pela cobiça e maldade dos homens que ainda não conseguiram racionalizar que somos todos filhos de Deus. Na bula papal de Leão XIII embora seja bastante longa e rica soterologia e hamartiologia[xli], o papa não declara abertamente que devesse libertar imediatamente todos os escravos para que pudessem alcançar a salvação eterna. Esta era a ‘palavra’ que Joaquim Nabuco buscava do papa.
            “Aplicando a Analise do Discurso encontrado no trabalho do Frances Michel Pêcheux, ‘o sujeito é atravessado tanto pela ideologia quanto pelo inconsciente’”. “Onde o sujeito tem a ilusão de ser a fonte, a origem de seus discursos”. O sujeito é social interpretado pela sua ideologia que conscientemente pensa ser de posse exclusiva e original, mas é um sujeito separado de sua fonte original, da fonte discursiva. Isto é, este sujeito tem a ilusão de ser o centro do discurso, mas é um sujeito separado da liberdade discursiva. Para a Análise do Discurso, “o dizer do sujeito é sempre determinado por outros dizeres, ou o discurso é sempre determinado por interdiscursos”. Logo, pode se conceber que “a memoria discursiva são esses sentidos já cristalizado e legitimados na sociedade que são reavivados no interdiscurso” (GUERRA, p.04).
            Até aqui consideramos o indivíduo como sujeito do discurso e o resultado são as cartas pastorais e as práticas que se traduzem em leitura e identifica a instituição e o indivíduo. Todavia, a Escritura é amplamente utilizada para justificar acomodações e corrigir comportamentos. Torna-se uma fonte de consulta e prática e de constante interpretação. Os textos bíblicos produzem teologia e daí decorre comportamento. Assim o texto bíblico é discurso que se interpreta e produz ideologias. Podemos comprovar empiricamente quando observamos a grande quantidade de religiões que se formaram a partir de interpretações bíblicas.  
            A teologia nos discursos aqui apresentado é sujeito dos discursos, ou seja, a própria teologia dá subsídio para todas as respostas para a escravidão. Tem base na teologia da corrupção humana, da queda do homem, do pecado original de Adão, enfim, na maldade humana que perpetuou após o dilúvio. A cobiça, o egoísmo, o materialismo, a concorrência mercantil são as justificativas para perpetuação da escravidão até o final do séc. XIX. A desvalorização da raça negra em detrimento de possíveis maus entendimento do cristianismo contribuiu para continuidade da instituição.
A teologia é sujeito (fonte) do discurso conforme o conceito de AD: “Onde o sujeito tem a ilusão de ser a fonte, a origem de seus discursos” (...) “o dizer do sujeito é sempre determinado por outros dizeres, ou o discurso é sempre determinado por interdiscursos”. O indivíduo ao discursar, seja por fala ou ações práticas, o faz pelas interpretações e inspirações que fez do texto das Escrituras e dele extraiu sua teologia e a transformou em ações práticas pessoais.
            O desenvolvimento cognitivo desses teólogos tem sua formação em diversas fontes: da teologia vista nas escrituras, das tradições e dogmas da Igreja e das experiências vividas do conhecimento histórico e do ambiente físico.
As Escrituras, como um todo, e os textos adjacentes que dizem respeito à escravidão, são interdiscursos formadores de discursos com teologia própria. Assim os textos de Efésios 6:5-9 e 1 Timóteo 4:1, 2, por exemplo, já é discurso construído pelos seus autógrafos: “a AD se pensa na historicidade do texto como constitutivo, tendo em vista o texto quanto materialidade histórica, de modo a se compreender como a matéria textual produz sentidos” (HERMANN. p.12).  A ideologia provém justamente desta interpretação que o indivíduo faz do texto e que transformou em discurso. “Desse modo, diante de todo objeto simbólico o sujeito é obrigado a tomar uma posição, a interpretar” (...) “A interpretação é, então, o lugar da ideologia, e sempre se dá em um lugar da história e da sociedade” (idem, p. 13).
Assim se justifica o conceito de AD onde: “o dizer do sujeito é sempre determinado por outros dizeres, ou o discurso é sempre determinado por interdiscursos”. Logo, pode se conceber que “a memoria discursiva são esses sentidos já cristalizados e legitimados na sociedade que são reavivados no interdiscurso” (GUERRA, p.04). Logo, a capacidade discursiva e ideológica dos bispos e padres, que são verificados em seus discursos e cartas pastorais não lhe são originais, mas tem sua fonte de inspiração as Escrituras e se completa com os textos bíblicos. Assim, as Escrituras com sua teologia própria é também fonte formadora de discurso. O que se verificou foi que a teologia no discurso é extremamente bíblica.  

 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS.

            O modelo de colonização utilizado no Brasil do séc. XVI, a religião católica e a sociedade lusitana colonizadora determinaram o rumo evolutivo e desenvolvimento da sociedade que se explicou no Brasil, e mais ainda, a formação da ‘psique’ eclesiástico existente em relação ao negro.  O pensamento eclesiástico começa a mudar no final do século quando já são vistas severas mudanças sociais e o negro passar a ser visto como pessoa.
            A companhia lusitana e o catolicismo determinaram o futuro Eterno de pelo menos duas etnias em terras brasileiras: a fé e o destino social dos indígenas e afros descendentes. A História nos conta que o objetivo inicial dos portugueses foi o regime de exploração extrativista, utilizando mão de obra indígena e depois colonização, se utilizando de mão de obra escrava com a presença de pouco contingente de brancos exclusivamente católicos vindos de Portugal. Enquanto que o modelo de colonização norte americano aconteceu grande contingente de emigrantes protestantes que fugiram das perseguições religiosas na Europa (inclusive em países católicos), inclusive mulheres se estabeleceram na costa leste para ali viverem. Isto fez toda diferença no psicológico da sociedade que se formou naquele país.    No caso brasileiro, a mão de obra escrava foi necessária desde o início do projeto de colonização brasileira e sem ela não seria possível se estabelecer e produzir, visto que os lusitanos católicos não tinham interesse de se estabelecer aqui. Não se pensava em Brasil sem pensar em escravidão. A Igreja seguiu o mesmo caminho balizando o modelo português, pois estavam juntos no processo. Na medida em que as missões religiosas iam se estabelecendo, com muita dificuldade, na costa brasileira e interior, dentro do interesse português, a escravidão se tornava normal e necessária. A carência afetiva pela ausência feminina no processo foi um fator determinante na formação do psicológico, na teologia e no trato com os negros.
   
            5.1.  A acomodação.
             A acomodação do clero com relação à escravidão se acentua no período no Segundo Império, visto que a Igreja procurava se estabelecer e se fortalecer diante do Estado e diante dos seus objetivos eclesiásticos. É fato, como vimos neste texto, que a abolição não fazia parte do seu projeto social de valorização da vida. Vimos que para a Igreja, o negro era visto como ser inferior e a escravidão uma maneira de libertá-lo da ignorância e dar-lhe vida eterna através do catolicismo.
            Esta ideologia da igreja no Brasil com relação à escravidão e sua apatia para com a abolição tem construção histórica, assim, no silêncio discursivo estão as respostas. Nos mais de trezentos anos de presença católica no Brasil a responsabilidade da catequese era de responsabilidade dos senhores de escravos. Raros foram os processos de integração do negro na irmandade católica como em Ouro Preto, por exemplo. Para o negro, a frequência às missas e a integração às Irmandades era uma forma de alcançar igualdade com o branco.

            5.2. Posição indiferente e conservadora.
             Assim, as acusações que pesavam sobre a Igreja de terem assumido posição indiferente e conservadora se submetendo aos interesses do Estado e dos senhores como afirmava o abolicionista Luiz Anselmo Fonseca[xlii] e só pode ser considerado válido dentro daquele contexto em que se queria forçar a Igreja para ser mais atuante no processo. Sendo que a Igreja também sofria prejuízos quando ainda permanecia sob o controle do Estado embora não tivesse consciência disso. E no pensamento de Riolando Azzi, a Igreja se encontrava num estado de penúria ao final do império e não tinha saúde espiritual para assumir compromissos abolicionistas.
            Os abolicionistas acusavam a Igreja de ser omissa na questão social dos negros e se manter calada diante dos movimentos abolicionistas. Sua influencia na sociedade poderia antecipar os acontecimentos, pois bastaria uma palavra do Papa, por exemplo. Esta era a opinião de Joaquim Nabuco, um dos principais abolicionistas. Na missão da Igreja estava incorporado o bem-estar dos oprimidos e cativos e o silêncio e a aparente apatia irritava os abolicionistas. O aparente desinteresse não parecia ser uma não percepção da questão negreira em si. Pois o que se viu foi a disposição de alguns bispos ou membro do clero em realizar a missão para o qual foram chamados.
Considero este desinteresse e apatia uma questão de resposta ao chamado ministerial de alguns e de falta de consciência à responsabilidade de seu cargo. Como exemplo, o bispo de Diamantina D. João Antônio Santos que respondeu ao chamado e fez a sua leitura perfeita da necessidade de sua sociedade tanto dos oprimidos como dos afortunados. Soube conciliar sua obediência a Deus com a obediência ao Estado; sua missão entre os oprimidos e fortunados sem promover conflitos entre ambos. E ainda, transformar suas ações e resultados concretos que o favoreceu cada vez mais. Adquiriu o respeito da sociedade civil e governamental ao cumprir sua missão simples de amor ao próximo.  Portanto, nem sempre e em todos os lugares a Igreja estava silenciosa e indiferente. As ações estavam condicionadas à leitura que cada clero fazia da necessidade no seu tempo. Leitura que poderia produzir conscientização favorável à classe servil. Não havia uma ordem superior de combate ao à condição servil; ficava condicionada a esta conscientização de cada clero em realizar um trabalho voltado para a emancipação.
            As perguntas de Camila Mendonça Pereira (2011) onde ela pergunta: “como o clero contemporâneo agira diante do acontecimento de maio 1888? Como foi marcada a participação da igreja Católica? E qual a participação da elite do clero? Por que o Papa interveio e qual sua influencia no processo de abolição?”.  São respondidas neste texto através do discurso pronunciado na audiência ao enviado especial do Brasil, Ministro João Artur de Souza Correia em 14 de janeiro de 1888. Neste discurso como vimos o papa se manifesta favorável à abolição dos escravos.
            Alguns papas anteriores a Leão XIII já haviam se manifestado contra a escravidão, principalmente de cristão, como já vimos neste texto. Algumas Ordens foram criadas para libertarem os cristãos das mãos dos Cerracenos, por exemplo.
O papa Gregório XVI em 13 de dezembro de 1839 deixou registrado em sua bula as seguintes palavras:

Admoestamos os fiéis para que se abstenham do desumano tráfico dos negros ou de quaisquer outros homens que sejam (...). Pelas passadas de nossos predecessores, admoestamos e conjuramos por Jesus Cristo todos os fiéis, de qualquer estado e condição que sejam, para que, daqui em diante, não continuem a oprimir tão injustamente os índios, negros ou outros quaisquer homens, privando-os de seus bens ou fazendo-os escravos, nem mesmo se atrevam a dar auxílio ou favor àqueles que tal tráfico exercita, por meio do qual os negros, como se fossem animais bravios, e não homens são reduzidos à escravidão de qualquer maneira que seja e, sem respeito para as leis da justiça e da humanidade, comprados, vendidos e condenados aos mais duros trabalhos, além do inconveniente de eternizar as guerras, e as discórdias nos países em que se faz o comércio da escravatura, em razão da esperança do ganho com que se animam os que se ocupam na apreensão dos negros. Tudo isto, portanto, nós reprovamos, como altamente indignos do nome de cristão, em virtude da autoridade apostólica que Nos compete e, com essa mesma autoridade, proibimos que qualquer eclesiástico ou leigo, sob qualquer pretexto que seja, se atreva a favorecer ou proteger o tráfico da escravatura ou pregar e ensinar em público ou em particular; de qualquer maneira que seja, coisa alguma contra o que nestas nossas letras se acha determinado (INTERNET).[xliii]
  
O papa Leão XIII na epístola “ln Plurimis” de 08 de maio de 1888 enviadas aos bispos do Brasil se colocou favorável as libertação dos escravos. O papa já tinha conhecimento das medidas que estavam sendo adotadas no Brasil para que se concretizasse o fim da libertação e afirma estar favorável aos acontecimentos: “a gratíssima opinião de que os brasileiros queriam abolir e extirpar a imanidade da escravidão” (...) “É profundamente deplorável a miséria da escravidão a que desde muitos séculos está sujeita uma parte não pequena da família humana”. Nesta epistola é lembrado a historia de Onésimo escravo fugitivo de Filemon que Paulo enviou de volta ao seu dono após tê-lo batizado. E continua informando que no passado “a igreja não quis proceder com precipitação em procurar a emancipação e a libertação dos escravos, o que evidentemente não se podia fazer senão de maneira tumultuosa que redundaria em dano deles mesmos e em detrimento da sociedade”. Ainda que dizendo que “não perdemos nenhuma oportunidade, procurava conseguir prudentemente que lhes fosse dada a liberdade”.  Se dirigindo ao Brasil o papa Leão XIII afirma:

E agora, veneráveis irmãos, a vós queremos dirigir o nosso pensamento e as nossas letras para manifestar-vos e repartir convosco a grande alegria que experimentamos pelas decisões que nesse império se adotaram, pertinentes à escravatura.  Uma vez que foi estabelecido, por lei que todos aqueles que se encontram ainda na condição de escravos serão admitidos na classe e nos direitos dos homens livres, não só isto em si nos parece bom, fausto e salutar, mas achamos nesta realidade confirmada e avalorada, a esperança de progresso consoladores para os interesses civis e religiosos”.

            Portando, parcialmente concluímos que a Igreja Católica, acusada de omissão no processo de abolição, em algum momento ou por algum componente clerical de expressão respondeu positivamente seus sentimentos favoráveis à causa servil. Porque estes sentimentos não poderiam ser transmitidos aos quatro ventos, mas havia interiormente este sentimento de dor e comoção favorável à abolição.
             
             5.3. Desinteresse pelas questões sociais.
             Com relação ao desinteresse pelas questões sociais surgiu devido aos conflitos entre Estado e Episcopados gerados a partir da Questão Religiosa (1972-1975) e seus motivos ocorridos a partir da década de 70, o que fez com que episcopado se preocupasse com reformas internas, romanização da Igreja e autoridade do papa nas questões da Igreja; fez com que a igreja se preocupasse com sua autonomia e autoridade e deixasse a questão escravista como sendo de ordem politica e econômica e não de ordem religiosa e missionaria. Camila Mendonça Pereira (2011) informa que neste período “o catolicismo brasileiro vivia sob influência do movimento ultramontano que pregava separação do Estado e obediência às determinações proveniente de Roma”. Acrescento ainda a afirmativa de João F. Houck (2008, pp.184,191) a Igreja Católica do final do sec. XIX, “deveria respeitar as atribuições do imperador em virtude do padroado régio” [xliv]. Assim a submissão ao Estado brasileiro naturalmente gerava conflitos com os ideais religiosos. E, Scott Mainwaring (2004, p.16) afirma que “o objetivo principal de qualquer Igreja é propagar sua mensagem religiosa”, mas que dependendo da percepção que esta faça dessa mensagem, pode vir a se preocupar com a defesa de interesses, tais como unidade e posição. E que “toda instituição se preocupa com a própria preservação; muitas tratam de se expandir”.  Estas situações poderiam ter influenciado a liderança numa mudança de objetivos e interesses e feito silenciar sua mensagem religiosa e com isto não revelar o seu pensamento teológico.  No entanto, devemos considerar que quando aparecia uma oportunidade os bispos brasileiros promoviam campanhas de libertação dos negros; como foi o caso do Jubileu do papa Leão XIII. E conforme aqui descrito, nas vésperas da Lei Aurea o papa por duas ocasiões manifestou sua vontade diretamente junto a representantes brasileiros: no seu discurso em janeiro de 88 ao representante brasileiro por ocasião do Jubileu de Leão XIII e em fevereiro na audiência com o Deputado Joaquim Nabuco.
  
              5.4. Defesa de interesse.
             A hipótese de que a Igreja Católica estava defendendo e preservando interesses institucionais ao ficar ao lado do trono sem manifestar opinião em assuntos conflitantes de ordem politica e econômica e não conseguia perceber qual era sua real missão, pois conforme teoriza Scott Mainwaring (2004, p.16): “o objetivo principal de qualquer Igreja é propagar sua mensagem religiosa”, mas que dependendo da percepção que esta faça dessa mensagem, pode vir a se preocupar com a defesa de interesses, tais como unidade e posição. E que “toda instituição se preocupa com a própria preservação; muitas tratam de se expandir”. Assim, estava a Igreja preocupada de tal ponto com seus próprios interesses e atrelada ao Estado que deixou de lado a sua ‘mensagem religiosa’ e, portanto, seu discurso ficou comprometido esquecendo-se dos interesses dos escravos; também deve ser considerada como um dos motivos de tal apatia.
Desta forma, os abolicionistas pensavam que para consolidar a abolição pensava que uma ‘palavra’ final do papa que pudesse resolver, visto que nem a coroa e nem o episcopado brasileiro possuía tal autoridade. Nas palavras de Joaquim Nabuco “uma palavra que pudesse mudar a opinião”. O que Joaquim Nabuco buscou dos sacerdotes, do episcopado e por fim do papa foi justamente “uma palavra só”:

(...) que efeito prodigioso não faria a palavra do sacerdote que realmente pregasse a moral social do evangelho! Mas onde já se viu um missionário abolicionista! (...) ainda não houve no Brasil um bispo que levantassem a voz contra a escravidão, como os houve para levantar a voz contra a maçonaria, apesar de estar a escravidão mais condenadas por bulas pontíficiais – e por concílios – do que a maçonaria (HAUCK, p. 279).

A resposta do não pronunciamento do clero em defesa da abolição pode estar na afirmação de Scott Mainwaring (p.22) “à medida que institucionalizam, as organizações religiosas tendem a presentar maior preocupação com a autopreservação e expansão, além de se tronar menos flexíveis”. Mais adiante o autor afirma: “(...) Seu caráter institucional e seu desejo de universalização impõe restrições a futura direção da Igreja”. Desta forma, “ela mantém esse compromisso de universalização de todas as nações e de todos os credos políticos, evitando assim mudanças radicais em práticas eclesiásticas ou em política” (Idem, p.23).

            5.5. A hipótese falta de discurso a favor da emancipação e do atraso da abolição.            O fato de o Brasil ser o último país a emancipar os negros tem sua resposta na historicidade política, econômica e religiosa dessa nação.  Desde cedo na formação do Império já se cogitava a libertação gradual do elemento servil. Esta condição foi descartada por D. Pedro I que não quis atender aos pensamentos de José Bonifácio. No entanto, o que se viu foi a realização das ideias de Jose Bonifácio.  Os conflitos de interesse que surgiram no decorrer do primeiro e segundo império retardaram a emancipação. A ausência da Reforma Protestante na historicidade do Brasil pode ser um agravante maior, pois, o protestantismo respondeu melhor às questões sociais, politicas e econômicas nos países que se instalaram. A origem étnica dos colonizadores e sua psique, a formação psicológica, a mentalidade da classe dominante pode ser outro agravante. A religião dominante e sua cultura e visão do Evangelho, tudo contribui para o retardamento da emancipação.  
            Não houve uma voz profética que tangenciasse toda esta historicidade, pois as que se levantaram foram rechaçadas e se tornaram ocultas. Não houve na história do Brasil um libertador-messias, como Simon Bolívar ou como George Washington, que pudesse dar forma revolucionaria aos acontecimentos sociais. Todavia, houve muitas vozes e gritos entre os negros, proprietários, clero e abolicionistas e anônimos que no final alcançaram, ainda que tardia, sem derramamento de sangue, o objetivo. 
            A igreja não fez parte do movimento abolicionista radical liderado por Joaquim Nabuco, Jose do Patrocínio e outros. Não discursou nos palanques, teatros e nem no altar da capela contra ou a favor da abolição. Mas tudo indica, pelo estudo, que mesmo de forma apática e moderada, de modo geral, a Igreja fez a sua obra de acordo com as suas forças que possuía conforme explica na sua obra Riolando Azzi: A escravidão, o clero e o abolicionismo (1989). 
            Estas hipóteses devem ser consideradas, mas analisada com mais profundidade. A hipótese da mensagem da Igreja (clero) ficar prejudicada devida os interesses que perpassava o consciente eclesiástico sobre estar ao lado do poder ou estar sob Padroado Régio. Parece-me que o parecia ser uma boa coisa se tornou prejudicial ao desenvolvimento de suas funções ministeriais. O Estado interferindo nas ações da Igreja prejudicaram o andamento ministerial. No protestantismo não deu certo quando o Estado quis dominar as ações da Igreja. Biblicamente falando a Igreja tem seu governo.  Faltou à Igreja conscientização de sua relevância e importância na sociedade. Edson F. Lopes falando de Educação Cristã acentua:

[...] a igreja local somente alcançará o objetivo de glorificar a Deus se tiver consciente da imprescindível relevância da educação cristã para o aperfeiçoamento de seus integrantes no conhecimento e na comunhão com Deus, de sua função na sociedade em que esta inserida, podendo e devendo servir de sal e luz deste mundo (LOPES, p. 145 – grifo meu).

            5.6 A hipótese da falta de uma missão bem definida.
             A vontade de Deus estava bem definida na ‘mensagem religiosa’ da Igreja Primitiva a tal ponto que aquela submissão ao Imperador Romano e às autoridades só entravam em conflitos quando se tratava de negar a fé cristã em detrimento da vontade das autoridades que conflitavam com a Palavra de Deus, a Bíblia.  Caso contrário, a mensagem cristã percorria os territórios e realizava as transformações sociais na medida em que a sociedade ia crendo na mensagem.  O único objetivo era a pregação da mensagem do Evangelho e a salvação das almas; mas a partir do memento que foi se constituindo lideres (bispos), centros cristãos começaram os problemas e principalmente depois quando a Igreja ganhou a sombra confortável do Estado, como já foi esclarecido neste estudo.  No Brasil, como vimos o clero era como uma repartição pública do Estado Brasileiro que se beneficiava na cobrança de certos serviços ao publico; do nascimento após morte, mas que, no entanto, buscava ‘liberdade’ de ação nos assuntos eclesiásticos. Ocupada que estava com os serviços por ela oferecidos, certamente os interesses dos negros ficavam em ultimo plano.  
            Devemos considerar como positivo a libertação oferecido pela Igreja desenvolvida nos mosteiros das ordens católicas. Por determinação dos bispos foram obrigadas a alforriar seus escravos, pois eram acusadas pelos abolicionistas de que o cristianismo não era compatível com a escravidão, inclusive pelo jornal “O Abolicionista” de darem péssimo exemplo ao serem ‘senhores de escravos’; isto é, havia um envolvimento direto da Igreja com a escravidão, logo o seu discurso favorável à emancipação dos escravos ficava comprometido.
             Embora a Igreja seja acusada de não trabalhar com determinação e afinco pela libertação e se juntado aos abolicionistas, na bula do papa V.S. afirme o papel perseverante da Igreja na extinção da escravidão no decorrer dos séculos. Para o Papa à Igreja é confiada a fazer parte dessa ação de ‘amor ao próximo e caridade’ que ‘leva ao céu e perdoa muitos pecados’. Infelizmente devemos compreender e teremos que admitir que os últimos dias de escravidão no Brasil não foram marcados por sermões, homilias e discurso de libertação, mas da habilidade politica de poucos homens que no seu tempo fizeram a historia do Brasil.




[i]  TILIO, Rogério. p. 100  apud Fairclough, 1992, p. 63.
[ii] Como exemplo; a Inconfidência Mineira de 1798 onde o Estado rechaçou as ideias revolucionarias de “Igualdade, Liberdade e Fraternidade” e um dos objetivos em mente era a libertação dos escravos (VIOTTI DA COSTA, 17-18).
[iii] Sérgio Buarque de Holanda nasceu em São Paulo11 de julho de 1902 — São Paulo, 24 de abril de 1982) foi um historiador brasileiro. Foi também crítico literáriojornalista e um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores (PT). Formou-se pela Faculdade Nacional de Direito da Universidade do Brasil (atual Universidade Federal do Rio de Janeiro), onde obteve o título de bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais no ano de 1925. Começou a trabalhar como jornalista (no Jornal do Brasil), seguindo para Berlim, como correspondente, nos anos 1929-1931. (fonte: https://pt.wikipedia.org) visto em 24/07/2017 -  17:24 h.
[iv] HAUCK, p.27 apud Rodrigues, J. H. em Historias e Historias do Brasil, 8).
[v] William Wilberforce (24/08/1759 — 29/07/1833) foi um político britânicofilantropo e líder do movimento abolicionista do tráfico negreiro. Nativo de Kingston upon HullYorkshire, começou sua carreira política em 1780 como candidato independente, sendo deputado do condado de Yorkshire entre 1784 e 1812. Em 1785 converteu-se ao cristianismo, mudando completamente o seu estilo de vida e se preocupando ao longo de toda sua vida com a reforma evangélica. Em 1787, William Wilberforce conheceu Thomas Clarkson (abolicionista britânico) e um grupo abolicionista ao tráfico negreiro que incluía Granville SharpHannah More e Charles Middleton, importantes nomes da época e que juntos persuadiram Wilberforce a entrar também na causa. Assim, Wilberfoce logo se destacou tornando-se líder do grupo britânico abolicionista, liderando uma campanha no parlamento inglês contra o tráfico de escravos que resultou, em 1807, na aprovação do Ato contra o Comércio de Escravos (https://pt.wikipedia.org/wiki/William_Wilberforce, visto em 15/12/2017 –  21:35 h
[vi] MORAES, Isabel. Historia do Brasil. Barueri: Gold Editora. 2012, p. 39.
[vii]O Movimento dos Ceifasses foi organizado por Antônio Bento de Sousa e Castroadvogadojuiz e maçom no bojo do movimento abolicionista paulista. Eles organizavam fugas coletivas no final do século XIX, ou "roubavam os escravos de seus senhores" para enviá-los ao quilombo do Jabaquara na cidade de Santos e de lá para a província do Ceará, que já decretara a igualdade racial. O movimento de libertação dos escravos paulista surgiu com o poeta Luís Gama e, após sua morte, Antônio Bento assumiu a liderança do movimento. O nome Caifazes foi inspirado em uma passagem do evangelho de São João (GO. 11,50) em que sentencia Caifás: “Vós nada sabeis, nem compreendeis que convém que um homem morra pelo povo, para que o povo todo não pereça? E entregou Jesus a Pilatos”. A eficácia do movimento foi tão grande que a maioria das cidades paulistas já havia decretado a libertação dos escravos negros antes da Lei Áurea de 1888. (fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Movimento_dos_Caifazes, visto em 25/09/17 às 14:48 h.
[viii] SANTOS, p. 139 apud Nabuco, J. Minha formação. Rio de Janeiro: Coleção documentos do Brasil, no. 90, 1957.
[x] Oliveira, p.30
[xi] Idem,  p.29
[xii] OLIVEIRA, p.85 apud BAT – O Jequitinhonha. Diamantina. 17/07/1870,  no. 38
[xiii]  A Lei do Ventre Livre, ou Lei 2040 de 28 de Setembro de 1871 declarava livres os filhos de escravas os nascidos a partir daquela data.  O bispo D. João Antônio recebeu cartas do Gabinete do Ministério da Agricultura (em 07 de Julho de 1871)  informando que  a sua proposta à Assembleia Geral Legislativa seria apreciada, pois conciliava os interesses dos proprietários com a da religião.  Recebeu cartas também do Ministério dos Negócios do Império informando da aprovação da lei.
[xiv] PEDROSA, p. 7  apud BEOZZO, 1980, p. 280).
[xv] O Padroado Régio ultramontano foi concedido ao rei de Portugal no sec. XV pelo Papa e dava amplos poderes ao rei sobre a igreja. O papa Leão XII (ϯ1823-1829) reconheceu a independência do Brasil em 1826 e confirmou o bispado a rei D. Pedro I.
[xvi] Feijó atual como Ministro da Justiça na Regência Trina Permanente de 17/06/1831 a 12/10/1835, e na Regência Uma de 12/10/1835 a 18/09/1837 (Santos, p.132).
[xvii] Galicana- tendência separatista da Igreja Católica do poder de Roma e ao Papa (fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Galicanismo).  Febroniana doutrina que reduziu a autoridade papal e exaltou a autoridade dos bispos (fonte: https://www.bibliatodo.com/Diccionario-biblico/febroniano-febroniana
[xviii] Os documentos papais foram Mirai vos (1832) e Quanta Cura (1864) e seu anexo Silabus. Nestes documentos o papa  ressalta a necessidade de combater os inimigos da Igreja, o  valor do celibato e do matrimonio, condena o indifentismo, o racionalismo, liberdade de pensamento e de imprensa e a separação entre Igreja e Estado.  Na Silabus o papa condena a independência do homem dos ditames da igreja, condena o marxismo, o racionalismo e as sociedades secretas, inclusive a maçonaria (Santo p.133). 
[xix] A Ordem de Nosso Senhor Jesus Cristo originalmente era uma ordem religiosa e militar, criada a 14 de março de 1319 pela bula pontifícia Ad ea ex-quibus do Papa João XXII, que, deste modo, atendia aos pedidos do rei Dom Dinis. Recebeu o nome de Ordem dos Cavaleiros de Nosso Senhor Jesus Cristo[1] e foi herdeira das propriedades e privilégios da Ordem do Templo. Em Maio desse mesmo ano, numa cerimónia solene que contou com a participação do Arcebispo de Évora, do Alferes-Mor do Reino D. Afonso de Albuquerque e de outros membros da cúria régia, o rei Dom Dinis ratificou, em Santarém, a criação da nova Ordem. Foi-lhe concedido como sede o castelo de Castro Marim; mas em 1357 já a sede tinha sido instalada em Tomar, anterior sede templário. Em 1789 a Ordem de Cristo foi secularizada, tornando-se uma ordem honorífica até sua extinção, em 1910, com a implantação da República Portuguesa. A ordem foi refundada em 1917 como a Ordem Militar de Cristo e é presidida pelo seu grão-mestre, o Presidente da República Portuguesa (https://pt.wikipedia.org/wiki/Ordem_de_Cristo).
[xx] VASCONCELOS, Dr. Sergio S. Duets. Apud HOONAERT, Eduardo. Formação do catolicismo brasileiro. 1550-1800. Petrópolis: Vozes, 1978, p.35.
[xxi] VASCONCELOS, p.41 apud CINTRA, Raimundo. Candomblé e Umbanda, o desafio brasileiro. São Paulo: Paulinas, 1985, p. 36-38. E VASCONCELOS, p. 41 apud CINTRA, 1985, p. 87
[xxii] NEY SANTO, P. 05 -  Anais do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH • São Paulo, julho 2001.
[xxiii] Jo. 18:10 fala de Molco, escravo do Sumo Sacerdote de quem Pedro cortou-lhe a orelha; Flavio Josefo fala de Corinto guarda do corpo de Herodes (OLIVEIRA-OLIVEIRA, p. 156).
[xxiv] Galatas 3:27, Colossenses 3:11.
[xxv] OLIVEIRA-OLIVEIRA, (p.182) apud “in Epíst. ad Efésios homilia”. XIX, 5; PG. T. LXII, col. 134.
[xxvi] OLIVEIRA-OLIVEIRA, (p. 185) apud J. Guirald, Histoire Partiale, p. 159 e J. Guillen, La escravitude, p.81.
[xxvii] OLIVEIRA-OLIVEIRA, p. 197 apud M. Bloch, Mélanges, pp.272-273.
[xxviii] A definição básica de escravo na lei Romano-Bizantina foi: 1) alguém cuja mãe era uma escrava; 2) qualquer pessoa que tenha sido capturada em batalha; 3) qualquer pessoa que tenha vendido a si mesmo para pagar uma dívida.  Foi possível, no entanto, tornar-se um liberto ou um completo cidadão; tanto no Código Justiniano, como o direito Romano, havia extensas e complicadas regras para a libertação dos escravos. https://pt.wikipedia.org/wiki/Escravid%C3%A3o_na_Europa_ Medieval#cite_note-59m, visto em  22/09/17.
[xxix] Comércio de escravos: A demanda do mundo Islâmico dominou o comércio de escravos na Europa medieval. Durante a maior parte do tempo, no entanto, a venda de Cristãos escravos para os não Cristãos foi banido. No pactum Lotharii de 840 entre Veneza e o Império Carolíngio, Veneza prometido não comprar escravos cristãos  no Império, e não vender escravos Cristãos para Muçulmanos. A Igreja proibiu a exportação de Escravos Cristãos para as terras não Cristãs, por exemplo, no Conselho de Koblenz, em 922, no Conselho, de Londres, em 1102, e o Conselho de Armagh em 1171. (fone: https://pt.wikipedia.org/wiki/Escravid%C3%A3o_ na_Europa_ Medieval., visto em 22/09/17 às 17:05 h .
[xxx]  British History Freedom – Timeline – 12th Century, Disponivel  http://www.britsattheirbest.com/ freedom/f_time_12th_century.htm, visto em 22/09/17 às 17:27 h.
[xxxi] Tradução Geogle: "Ninguém, em seguida, presuma-se para se envolver nesse comércio nefasto em que até então, na Inglaterra, os homens costumavam ser vendidos como animais brutos". http://www.britsattheirbest.com/freedom/f_time_12th_century.htm, visto em 22/09/17 às 17:24.
[xxxii] Foi nesse sentido que proclamada a Republica  e promulgada a Constituição de 1891 quando a Igreja se viu vulnerável, uma vez que o Brasil se tornou uma nação Laica.
[xxxiii] Rauck, p.284 aped Leão XIII. Discurso pronunciado na audiência ao enviado especial  do Brasil, Ministro João Artur de Souza Correia em 14 de Janeiro de 1888 in Moniteur de Rome, edição de 19 de janeiro de 1888. Arquivo do Itamarati, M.D.B. 209/4/8. 1882-18888. 
[xxxiv] Rauck, p. 285 apud Nabuco, Carolina. A vida de Joaquim Nabuco. Col. Documentos Brasileiros. 92, 4ª. ed. Rio de Janeiro:  Livraria José Olympio Editora, 1958 [114]. 
[xxxv] A Analise do Discurso é uma pratica Linguística no campo da comunicação.
E consiste em analisar a estrutura de um texto e a partir disto compreende as construções ideológicas presente no memo. 
[xxxvi] NVI - BIBLIA SAGRADA Nova Versão Internacional, Novo Testamento, Cartas aos Efésios 6:5-8 São Paulo: Editora Vida; 2007.  P. 1551. 
[xxxvii] FILHO, TORCA, p.3 apud  Bakhtin 1997 b, p. 317.
[xxxviii] Leão XIIIO.F.S.; nascido Vincenzo Gioacchino Raffaele Luigi Pecci-Prosperi-Buzzi; (Carpineto Romano2 /03/1810 — Roma20/07/1903). Foi ordenado sacerdote da Igreja Católica em 31/12/1837.   Foi eleito papa em 20 de fevereiro de 1878 e coroado em 03 de março do mesmo ano e permaneceu no posto até sua morte. Concedeu a Sua Alteza Imperial, a Princesa D. Isabel do Brasil uma Rosa de Ouro, símbolo de generosidade por esta ter publicado a Lei Áurea, lei que extinguiu a escravidão no Brasil.  (https://pt.wikipedia.org/wiki/Papa_Le%C3%A3o_XIII, visto em 03/10/2017 - 23:35 h.
[xli]  Soterologia – (estudo da  salvação) é  parte da teologia que trata da  salvação do homem. Doutrina bíblica  que analisa o desvio do homem perdido  e a salvação da humanidade por Jesus Cristo.  .
Hamartiologia – (Estudo do pecado) –  na  Teologia Sistemática  esta ciência trata do estudo do pecado e suas origens e suas consequências. 
[xlii] Azzi, 1988, p.55 e Fonseca, 1887, p.12. 
[xliv] Padroado Régio era o poder que o Papa concedia a reis, principalmente da península Ibérica, e dava amplos poderes ao rei sore o clero da Igreja.  Comandando todas suas ações. O Padroado Régio foi concedido a rei de Portugal no séc. XV. O papa Leão XII (ϯ1823-1829) reconheceu a independência do Brasil em 1826 e confirmou o bispado a rei D. Pedro. 

  
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

 AZZI, Riolando (Org.). A vida religiosa no Brasil enfoque históricos. São Paulo:                              Edições             Paulinas, 1983.
_____, Riolando. A escravidão, o clero e o abolicionismo. In Clio: Revista de   pesquisa               no. 12. Clio de Janeiro: Ibrades, 1989. Disponível no site:                                                                http://www.revista.ufpe.br/revistaclio/index. php/revista/article/view/483. Visto                              em 26/09/17 às  5:06 h.
AZEVEDO Sara Dionizia R. Formação discursiva e discurso em Michel Foucault.   In. ‘              Revista eletrônica de pesquisa na graduação de filosofia. Marília: Vol.           06, 202,                 no. 02, 2013. Disponível no site https://www.marilia.unesp.br/Home/RevistasEletronicas/
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8. REFERENCIA





[i]  TILIO, Rogério. p. 100  apud Fairclough, 1992, p. 63.
[ii] Como exemplo; a Inconfidência Mineira de 1798 onde o Estado rechaçou as ideias revolucionarias de “Igualdade, Liberdade e Fraternidade” e um dos objetivos em mente era a libertação dos escravos (VIOTTI DA COSTA, 17-18).
[iii] Sérgio Buarque de Holanda nasceu em São Paulo11 de julho de 1902 — São Paulo, 24 de abril de 1982) foi um historiador brasileiro. Foi também crítico literáriojornalista e um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores (PT). Formou-se pela Faculdade Nacional de Direito da Universidade do Brasil (atual Universidade Federal do Rio de Janeiro), onde obteve o título de bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais no ano de 1925. Começou a trabalhar como jornalista (no Jornal do Brasil), seguindo para Berlim, como correspondente, nos anos 1929-1931. (fonte: https://pt.wikipedia.org) visto em 24/07/2017 -  17:24 h.
[iv] HAUCK, p.27 apud Rodrigues, J. H. em Historias e Historias do Brasil, 8).
[v] William Wilberforce (24/08/1759 — 29/07/1833) foi um político britânicofilantropo e líder do movimento abolicionista do tráfico negreiro. Nativo de Kingston upon HullYorkshire, começou sua carreira política em 1780 como candidato independente, sendo deputado do condado de Yorkshire entre 1784 e 1812. Em 1785 converteu-se ao cristianismo, mudando completamente o seu estilo de vida e se preocupando ao longo de toda sua vida com a reforma evangélica. Em 1787, William Wilberforce conheceu Thomas Clarkson (abolicionista britânico) e um grupo abolicionista ao tráfico negreiro que incluía Granville SharpHannah More e Charles Middleton, importantes nomes da época e que juntos persuadiram Wilberforce a entrar também na causa. Assim, Wilberfoce logo se destacou tornando-se líder do grupo britânico abolicionista, liderando uma campanha no parlamento inglês contra o tráfico de escravos que resultou, em 1807, na aprovação do Ato contra o Comércio de Escravos (https://pt.wikipedia.org/wiki/William_Wilberforce, visto em 15/12/2017 –  21:35 h
[vi] MORAES, Isabel. Historia do Brasil. Barueri: Gold Editora. 2012, p. 39.
[vii]Movimento dos Ceifasses foi organizado por Antônio Bento de Sousa e Castroadvogadojuiz e maçom no bojo do movimento abolicionista paulista. Eles organizavam fugas coletivas no final do século XIX, ou "roubavam os escravos de seus senhores" para enviá-los ao quilombo do Jabaquara na cidade de Santos e de lá para a província do Ceará, que já decretara a igualdade racial. O movimento de libertação dos escravos paulista surgiu com o poeta Luís Gama e, após sua morte, Antônio Bento assumiu a liderança do movimento. O nome Caifazes foi inspirado em uma passagem do evangelho de São João (GO. 11,50) em que sentencia Caifás: “Vós nada sabeis, nem compreendeis que convém que um homem morra pelo povo, para que o povo todo não pereça? E entregou Jesus a Pilatos”. A eficácia do movimento foi tão grande que a maioria das cidades paulistas já havia decretado a libertação dos escravos negros antes da Lei Áurea de 1888. (fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Movimento_dos_Caifazes, visto em 25/09/17 às 14:48 h.
[viii] SANTOS, p. 139 apud Nabuco, J. Minha formação. Rio de Janeiro: Coleção documentos do Brasil, no. 90, 1957.
[x] Oliveira, p.30
[xi] Idem,  p.29
[xii] OLIVEIRA, p.85 apud BAT – O Jequitinhonha. Diamantina. 17/07/1870,  no. 38
[xiii]  A Lei do Ventre Livre, ou Lei 2040 de 28 de Setembro de 1871 declarava livres os filhos de escravas os nascidos a partir daquela data.  O bispo D. João Antônio recebeu cartas do Gabinete do Ministério da Agricultura (em 07 de Julho de 1871)  informando que  a sua proposta à Assembleia Geral Legislativa seria apreciada, pois conciliava os interesses dos proprietários com a da religião.  Recebeu cartas também do Ministério dos Negócios do Império informando da aprovação da lei.
[xiv] PEDROSA, p. 7  apud BEOZZO, 1980, p. 280).
[xv] O Padroado Régio ultramontano foi concedido ao rei de Portugal no sec. XV pelo Papa e dava amplos poderes ao rei sobre a igreja. O papa Leão XII (ϯ1823-1829) reconheceu a independência do Brasil em 1826 e confirmou o bispado a rei D. Pedro I.
[xvi] Feijó atual como Ministro da Justiça na Regência Trina Permanente de 17/06/1831 a 12/10/1835, e na Regência Uma de 12/10/1835 a 18/09/1837 (Santos, p.132).
[xvii] Galicana- tendência separatista da Igreja Católica do poder de Roma e ao Papa (fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Galicanismo).  Febroniana doutrina que reduziu a autoridade papal e exaltou a autoridade dos bispos (fonte: https://www.bibliatodo.com/Diccionario-biblico/febroniano-febroniana
[xviii] Os documentos papais foram Mirai vos (1832) e Quanta Cura (1864) e seu anexo Silabus. Nestes documentos o papa  ressalta a necessidade de combater os inimigos da Igreja, o  valor do celibato e do matrimonio, condena o indifentismo, o racionalismo, liberdade de pensamento e de imprensa e a separação entre Igreja e Estado.  Na Silabus o papa condena a independência do homem dos ditames da igreja, condena o marxismo, o racionalismo e as sociedades secretas, inclusive a maçonaria (Santo p.133). 
[xix] Ordem de Nosso Senhor Jesus Cristo originalmente era uma ordem religiosa e militar, criada a 14 de março de 1319 pela bula pontifícia Ad ea ex-quibus do Papa João XXII, que, deste modo, atendia aos pedidos do rei Dom Dinis. Recebeu o nome de Ordem dos Cavaleiros de Nosso Senhor Jesus Cristo[1] e foi herdeira das propriedades e privilégios da Ordem do Templo. Em Maio desse mesmo ano, numa cerimónia solene que contou com a participação do Arcebispo de Évora, do Alferes-Mor do Reino D. Afonso de Albuquerque e de outros membros da cúria régia, o rei Dom Dinis ratificou, em Santarém, a criação da nova Ordem. Foi-lhe concedido como sede o castelo de Castro Marim; mas em 1357 já a sede tinha sido instalada em Tomar, anterior sede templário. Em 1789 a Ordem de Cristo foi secularizada, tornando-se uma ordem honorífica até sua extinção, em 1910, com a implantação da República Portuguesa. A ordem foi refundada em 1917 como a Ordem Militar de Cristo e é presidida pelo seu grão-mestre, o Presidente da República Portuguesa (https://pt.wikipedia.org/wiki/Ordem_de_Cristo).
[xx] VASCONCELOS, Dr. Sergio S. Duets. apud HOONAERT, Eduardo. Formação do catolicismo brasileiro. 1550-1800. Petrópolis: Vozes, 1978, p.35.
[xxi] VASCONCELOS, p.41 apud CINTRA, Raimundo. Candomblé e Umbanda, o desafio brasileiro. São Paulo: Paulinas, 1985, p. 36-38. E VASCONCELOS, p. 41 apud CINTRA, 1985, p. 87
[xxii] NEY SANTO, P. 05 -  Anais do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH • São Paulo, julho 2001.
[xxiii] Jo. 18:10 fala de Molco, escravo do Sumo Sacerdote de quem Pedro cortou-lhe a orelha; Flavio Josefo fala de Corinto guarda do corpo de Herodes (OLIVEIRA-OLIVEIRA, p. 156).
[xxiv] Galatas 3:27, Colossenses 3:11.
[xxv] OLIVEIRA-OLIVEIRA, (p.182) apud “in Epíst. ad Efésios homilia”. XIX, 5; PG. T. LXII, col. 134.
[xxvi] OLIVEIRA-OLIVEIRA, (p. 185) apud J. Guirald, Histoire Partiale, p. 159 e J. Guillen, La escravitude, p.81.
[xxvii] OLIVEIRA-OLIVEIRA, p. 197 apud M. Bloch, Mélanges, pp.272-273.
[xxviii] A definição básica de escravo na lei Romano-Bizantina foi: 1) alguém cuja mãe era uma escrava; 2) qualquer pessoa que tenha sido capturada em batalha; 3) qualquer pessoa que tenha vendido a si mesmo para pagar uma dívida.  Foi possível, no entanto, tornar-se um liberto ou um completo cidadão; tanto no Código Justiniano, como o direito Romano, havia extensas e complicadas regras para a libertação dos escravos. https://pt.wikipedia.org/wiki/Escravid%C3%A3o_na_Europa_ Medieval#cite_note-59m, visto em  22/09/17.
[xxix] Comércio de escravos: A demanda do mundo Islâmico dominou o comércio de escravos na Europa medieval. Durante a maior parte do tempo, no entanto, a venda de Cristãos escravos para os não Cristãos foi banido. No pactum Lotharii de 840 entre Veneza e o Império Carolíngio, Veneza prometido não comprar escravos cristãos  no Império, e não vender escravos Cristãos para Muçulmanos. A Igreja proibiu a exportação de Escravos Cristãos para as terras não Cristãs, por exemplo, no Conselho de Koblenz, em 922, no Conselho, de Londres, em 1102, e o Conselho de Armagh em 1171. (fone: https://pt.wikipedia.org/wiki/Escravid%C3%A3o_ na_Europa_ Medieval., visto em 22/09/17 às 17:05 h .
[xxx]  British History Freedom – Timeline – 12th Century, Disponivel  http://www.britsattheirbest.com/ freedom/f_time_12th_century.htm, visto em 22/09/17 às 17:27 h.
[xxxi] Tradução Geogle: "Ninguém, em seguida, presuma-se para se envolver nesse comércio nefasto em que até então, na Inglaterra, os homens costumavam ser vendidos como animais brutos". http://www.britsattheirbest.com/freedom/f_time_12th_century.htm, visto em 22/09/17 às 17:24.
[xxxii] Foi nesse sentido que proclamada a Republica  e promulgada a Constituição de 1891 quando a Igreja se viu vulnerável, uma vez que o Brasil se tornou uma nação Laica.
[xxxiii] Rauck, p.284 aped Leão XIII. Discurso pronunciado na audiência ao enviado especial  do Brasil, Ministro João Artur de Souza Correia em 14 de Janeiro de 1888 in Moniteur de Rome, edição de 19 de janeiro de 1888. Arquivo do Itamarati, M.D.B. 209/4/8. 1882-18888. 
[xxxiv] Rauck, p. 285 apud Nabuco, Carolina. A vida de Joaquim Nabuco. Col. Documentos Brasileiros. 92, 4ª. ed. Rio de Janeiro:  Livraria José Olympio Editora, 1958 [114]. 
[xxxv] A Analise do Discurso é uma pratica Linguística no campo da comunicação.
E consiste em analisar a estrutura de um texto e a partir disto compreende as construções ideológicas presente no memo. 
[xxxvi] NVI - BIBLIA SAGRADA Nova Versão Internacional, Novo Testamento, Cartas aos Efésios 6:5-8 São Paulo: Editora Vida; 2007.  P. 1551. 
[xxxvii] FILHO, TORCA, p.3 apud  Bakhtin 1997 b, p. 317.
[xxxviii] Leão XIIIO.F.S.; nascido Vincenzo Gioacchino Raffaele Luigi Pecci-Prosperi-Buzzi; (Carpineto Romano2 /03/1810 — Roma20/07/1903). Foi ordenado sacerdote da Igreja Católica em 31/12/1837.   Foi eleito papa em 20 de fevereiro de 1878 e coroado em 03 de março do mesmo ano e permaneceu no posto até sua morte. Concedeu a Sua Alteza Imperial, a Princesa D. Isabel do Brasil uma Rosa de Ouro, símbolo de generosidade por esta ter publicado a Lei Áurea, lei que extinguiu a escravidão no Brasil.  (https://pt.wikipedia.org/wiki/Papa_Le%C3%A3o_XIII, visto em 03/10/2017 - 23:35 h.
[xli]  Soterologia – (estudo da  salvação) é  parte da teologia que trata da  salvação do homem. Doutrina bíblica  que analisa o desvio do homem perdido  e a salvação da humanidade por Jesus Cristo.  .
Hamartiologia – (Estudo do pecado) –  na  Teologia Sistemática  esta ciência trata do estudo do pecado e suas origens e suas consequências. 
[xlii] Azzi, 1988, p.55 e Fonseca, 1887, p.12. 
[xliv] Padroado Régio era o poder que o Papa concedia a reis, principalmente da península Ibérica, e dava amplos poderes ao rei sore o clero da Igreja.  Comandando todas suas ações. O Padroado Régio foi concedido a rei de Portugal no séc. XV. O papa Leão XII (ϯ1823-1829) reconheceu a independência do Brasil em 1826 e confirmou o bispado a rei D. Pedro.